sábado, 12 de setembro de 2015

CICLO VERDE E AMARELO: Tatuagem

Jesuíta e Irandhir: sem tabus ou moralismo.  

Tatuagem é um tipo de filme raro, não apenas nos lançamentos brasileiros, mas no mundo mesmo. Tem uma alma incendiária que pode causar incômodo na maioria dos espectadores que estão acostumados a filmes comportados, ou que lida com a afetividade entre dois homens, política ou com a própria arte de forma mais pudica. Existe muita nudez em Tatuagem, mas também uma inventividade que nos faz até esquecer que o roteiro poderia ser mais enxuto e sua duração um pouco mais curta. Independente disso, o diretor Hilton Lacerda cumpre sua proposta com bastante coragem num cenário em que o cinema ousa cada vez menos. A trama é ambientada em Recife no ano de 1978, em plena ditadura militar, seguimos a trajetória da trupe teatral Chão de Estrelas liderada por Clécio Wanderley (o sempre competente Irandhir Santos). Os espetáculos do grupo são cheio de deboche sobre o sistema político, o moralismo e as convenções. As apresentações são de uma criatividade de encher os olhos com o uso de materiais dos mais variados, o que torna o visual do filme ainda mais colorido e vibrante (auxiliado pela trilha sonora de primeiríssima qualidade). Paralelo a esse mundo, acompanhamos a trajetória do jovem militar Fininha (o então novato Jesuíta Barbosa), que namora a irmã de um dos atores da trupe, o elétrico Paulete (o ótimo Rodrigo Garcia). Eis que o caminho de Fininha e Clécio se cruzam quase que por acaso e começa um romance entre os dois personagens -  cujo o desfecho já podemos imaginar qual será. O filme de estreia de Lacerda se inspira em várias histórias de trupes teatrais que realizavam espetáculos anárquicos contra o sistema, tendo a maior inspiração na trajetória do argentino Túlio Carella, que viveu no Recife nos anos 1960 e em meados da década seguinte fundou o grupo Vivencial, cujo trabalho era bastante semelhante ao que aparece no filme. Para além dessa parte verídica, o filme investe numa abordagem bastante diferente das relações de gênero (afinal, Clécio tem um filho e a mãe dele não vê problema algum em Clécio se envolver com outros homens - o maior problema é que Fininha é militar) e da postura artística na época da ditadura. Pela naturalidade com que filma o exagero, a nudez e duas cenas de sexo entre os protagonistas, Tatuagem não é para todos os gostos (e nem quer ser), mas quem embarcar na atmosfera do filme verá uma obra com atuações marcantes e grande plasticidade visual. 

Tatuagem (Brasil/2013) de Hilton Lacerda com Irandhir Santos, Jesuíta Barbosa e Rodrigo Carcia. ☻☻☻

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