sexta-feira, 29 de novembro de 2013

DVD: No

Bernal: o poder da imagem e do discurso. 

Indicado ao Oscar de filme estrangeiro em 2013, No surpreendeu até seu diretor que considerava a situação ridícula, já que não via seu filme com cara de Oscar. Na época, eu ainda não havia assistido o filme e pensei ter entendido o que ele quis dizer. Imaginei que fosse uma dessas produções moderninhas, cheia de recursos narrativos que muitas vezes parece mais confuso do que eficiente na hora de contar a história. Quando assisti ao filme cheguei à conclusão de que não havia motivo da surpresa do diretor Pablo Larraín (diretor do estranho Tony Manero/2008), já que No é de uma eficiência ímpar ao contar a história do plebiscito armado por Augusto Pinochet para legitimar sua ditadura no Chile. Tive a ideia ruim de que Larraín quis cuspir no prato que comia, já que produz e dirige uma série bem sucedida da HBO (a badalada Prófugos) e assinou uma produção dirigida por Abel Ferrara estrelada por Willem Dafoe (4:44 - O Fim do Mundo/2011), ou seja, tem algum cacife e amigos em Hollywood para perceberem e divulgarem as qualidades do seu trabalho. Melhor achar que era só falsa modéstia. Talvez o diretor temesse à estética granulada da fotografia, que lhe confere uma estética bastante diferente dos filmes convencionais, mas essa ideia seria incoerente, já que confere ao longa uma identidade estilística ainda mais forte e bastante coerente com a época em que a história acontece. Ambientado em 1988, o roteiro conta a história do jovem publicitário René Saavedra (Gael Garcia Bernal) que é contratado pelos militantes da oposição ao governo Pinochet para auxiliar na campanha do Não, ou seja, do grupo que não queria que Pinochet continuasse o seu governo com desaparecimentos políticos, opressão e censura. Mal sabia René, que seu patrão seria um dos cérebros por trás da campanha do Sim - que exaltava a industrialização do país e o estabelecimento de um padrão de vida inspirado pelo american way of life - em que o consumo tentava disfarçar todos os problemas que o país enfrentava (isso me lembra alguma coisa...). Chega a ser exaustiva a quantidade de informações que Larraín apresenta para mostrar as campanhas pautadas nos dois pontos de vista distintos. É interessante que durante a campanha, podemos perceber uma mudança no próprio olhar do protagonista, ele mesmo um exilado (depois que o pai foi perseguido no México, a família mudou-se para o Chile). Nos primeiros comerciais, René é pura linguagem publicitária, com ideias que não agradam o grupo político para que trabalha com jingles, sorrisos e modelos que possuem pouca relação com a maioria da população chilena. Esse ponto de mudança é marcado pela ex-esposa do personagem, uma militante que vive tendo problemas com a polícia. Aos poucos, o filme desvenda como eram traçadas as estratégias de ambas as campanhas, o uso do humor, da censura, dos formadores de opinião, dos artistas e esclarece como todas aquelas ações serviram para tornar legítimo um referendo idealizado para ser uma grande mentira. Utilizando uma tensão político-narrativa que era muito comum nos filmes da década de 1970 e algum toque de humor (e que fez a glória de Argo/2012), No consegue ser bastante elaborado em suas intenções e explica um pouco da história que não lemos nos livros escolares. Além da história, que é em si bastante interessante, o filme ainda nos faz pensar sobre o poder das imagens e do discurso da/na mídia (mesmo na cena final, onde vende-se a imagem de um Chile glamouroso pós-referendo) e como um ditador para permanecer na mídia não depende apenas da vontade dele, mas também de um grupo da população que se beneficia e legitima o regime autoritário. 

No (Chile/2012) de Pablo Larraínn com Gael Garcia Bernal, Alfredo Castro, Luiz Gnecco, Antonia Zeggers, Pascal Montero. ☻☻☻☻

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