domingo, 10 de abril de 2011

FILMED+: A Rosa Púrpura do Cairo


Jeff Daniels e Mia Farrow: O galã e a cinéfila romântica.

Enquanto cinéfilo devo começar dizendo que cinema é a minha droga. Uso para me desligar do universo por algumas horas e me embrenhar por histórias que não são as minhas, mesmo que algumas sejam muito semelhantes. Tem gente que fuma, tem gente que bebe, cheira ou faz sexo umas dezoito vezes por dia. Eu não, eu assisto filmes. Claro que não chego a ser como a personagem de Mia Farrow em A Rosa Púrpura do Cairo, um dos filmes mais geniais de Woody Allen. Afinal de contas, eu sei que por mais realista que um filme possa parecer, ele é um filme. E isso serve até para os documentários. Mia é Cecília, uma garçonete de espelunca maltratada pela vida e pelo marido beberrão. A sociedade na época também não era das melhores - já que os EUA atravessavam a Grande Depressão com a quebra da Bolsa de Valores de Nova York em 1929.  A cidade que vemos em tantos filmes de Allen é mostrada nesse ar decadente que incentiva ainda mais a fuga da realidade da qual Cecília desfruta sempre que vai ao cinema - mesmo que seja para ver pela quinta vez seu filme favorito: A Rosa Púrpura do Cairo. É nesta quinta vez que acontece algo inusitado, o personagem do filme, Tom Baxter (Jeff Daniels, que nasceu para o papel) sai da tela para encontrar-se com Cecilia. O fato pega à platéia e aos outros personagens do filme de surpresa, já que sem ele o filme não pode continuar. Baxter e Cecília irão viver um relacionamento incomum e ela aprenderá algumas lições: o galã nunca se fere ou se despenteia, ele é simplesmente perfeito, romântico e gentil! E ainda é capaz de ser levado à um prostíbulo por acidente e sair de lá ileso. Ou seja, um sujeito que só existe nos filmes. Mas, enquanto Cecília terá que dar satisfações ao marido, Baxter terá que fugir da polícia, dos produtores do filme e até do ator que o interpreta. É quando o ambicioso ator Gil Shepherd (o mesmo Daniels) aparece que Allen coloca suas unhas de fora. Nunca perdemos de vista que Baxter é um personagem interpretado por Shepherd, portanto o ator não parece digno de confiança em seu plano de fazer Baxter voltar para a tela. Apenas Cecília, inebriada por ser admirada por dois homens, não percebe que criador e criatura são pessoas distintas. Além desta trama surreal, Allen ainda tece comentários sobre as relações das pessoas com o cinema. Além da alienação proporcionada à Cecília (da qual ela toma consciência no momento mais indevido) existem os que vêem nos filme um produto como outro qualquer, além de ter aqueles que não "pagam ingresso para ver pessoas conversando na tela". No fundo da trama existe o tema real do filme: a experiência quando assistimos um filme é somente nossa. O que vemos, sentimos ou refletimos são frutos de nossa interação com uma obra que até então não nos pertencia. Talvez por isso, mesmo depois de aprender sua lição da forma mais dolorosa, Cecília volte à sala escura para viver mais uma aventura pessoal.

A Rosa Púrpura do Cairo (The Purple Rose of Cairo/EUA-1985) de Woody Allen, com Mia Farrow, Jeff Daniels, Dianne Wiest e Danni Aielo. ☻☻☻☻☻

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