sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

Na Tela: Três Anúncios Para um Crime

Frances: entre a justiça e a vingança. 

A filha adolescente de Mildred foi estuprada, queimada e morta há meses e a polícia não faz ideia de quem possa ter cometido o crime. Tudo aconteceu na aparentemente tranquila cidade de Ebbing no estado de Missouri nos Estados Unidos. Insatisfeita com a situação, considerando que existe um descaso com a tragédia que atravessou sua vida, Mildred resolve utilizar três outdoors em uma estrada da cidade indagando sobre os rumos da investigação que não aponta responsáveis. Fosse lançado há algum tempo atrás, Três Anúncios Para um Crime seria um corpo estranho entre os indicados ao Oscar, mas hoje ele ocupa o posto de favorito entre os nove indicados na categoria de Melhor Filme - e tem chance de levar alguns dos sete prêmios a que concorre, especialmente o de melhor atriz para Frances McDormand, que entrega outra atuação memorável na pele da endurecida Mildred. Quem conhece o trabalho de Frances já está acostumado em vê-la dar um toque especial em seus personagens, tanto que já tem um Oscar na estante pela policial de Fargo (1996). Aqui ela vive uma mulher cansada de silenciar a raiva e indignação diante do descaso das autoridades, o problema é que quando ela libera todo o ódio que estava cansada de segurar, acarreta um emaranhado de situações que revelam o que a pacata Ebbing preferia manter escondido. É neste momento que o filme opta por sempre seguir um caminho diferente ao abordar seus personagens, seja a própria Mildred, o delegado Willoughby (Woody Harrelson, indicado ao prêmio de coadjuvante) que demonstra sensibilizado, mas impotente diante do caso ou o policial Dixon (Sam Rockwell, favorito à estatueta de coadjuvante deste ano após levar para casa praticamente todas as premiações do ano), um grosseiro, racista, homofóbico e que abusa de autoridade sempre que possível. No entanto, além de aparecer em seu relacionamento com a mãe - apresentada como uma bela professora para o filho ser tudo o que é - Dixon recebe o arco mais transformador do filme. Escrito e dirigido pelo inglês Martin McDonagh (que já foi indicado ao Oscar por Na Mira do Chefe/2008 e já tem um Oscar na estante pelo curta Six Shooter/2004) ele conjuga aqui os dois pilares de seu estilo (a violência e o humor negro) mas os costura com uma linha mais emocional sem medo de expandir a história para vários personagens - seja o filho (Lucas Hedges) de Mildred que se incomoda com as ações da mãe, o jovem administrador dos outdoors (Caleb Laundry Jones) ou a esposa do delegado (Abbie Cornish).  Mais contido em seu humor, McDonagh conta uma história que libera a raiva aos poucos, acarretando sempre consequências destruidoras que não atingem o foco e por isso mesmo, gera a ânsia por uma catarse que nunca chega. Enquanto vira a cidade do avesso, Três Anúncios para Um Crime nos faz pensar até que ponto a vingança não se confunde com justiça, quanto a ineficiência do sistema pode gerar mais violência e o quanto o mundo se parece cada vez mais  com aquela cidadezinha com suas intolerâncias e incompreensões. Talvez por isso a última cena nos deixe com um nó na garganta imaginando onde aquilo tudo irá parar... ou se vai parar. Não foi por acaso que Três Anúncios para Um Crime se configurou como o favorito da temporada, torna-se impossível não torcer pela justiça que Mildred tanto espera, mas aos poucos começamos a repensar suas atitudes e perceber que se perder no caminho é mais fácil do que se imagina.  

Três Anúncios Para um Crime (Three Billboards Outside Ebbing, Missouri/EUA-2017) de Martin McDonagh com Frances McDormand, Sam Rockwell, Woody Harrelson, Lucas Hedges, Peter Dinklage, Caleb Laundry Jones e Abbie Cornish. ☻☻☻☻

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