sexta-feira, 4 de março de 2016

Na Tela: Tangerine

Mya e Kiki: pelas ruas de Los Angeles. 

Sin-Dee (Kitana Kiki Rodriguez) acaba de voltar para cidade de Los Angeles e ao reencontrar sua amiga Alexandra (a ótima Mya Taylor), acaba descobrindo que seu namorado, Chester (James Ransone) a traiu enquanto estava fora. Surpresa e decepcionada, Sin-Dee fica furiosa e parte em busca da tal amante de seu amado. Parece uma história que você já assistiu um milhão de vezes, mas Tangerine está disposto a ser um filme bem diferente do que você imagina. Para começar, Sin-Dee e Alexandra são transexuais (dentro e fora da tela) e se sustentam fazendo programas pelas ruas de Los Angeles, caminhando pela calçada da fama e recebendo por frequentar becos conhecidos com seus clientes. Esqueça todo o glamour que a cidade pode evocar, a opção do diretor Sean Baker é virar, o que nos parece tão comum, pelo avesso. Para isso, conta com um roteiro com os diálogos mais inusitados que ouvi no cinema recente, verdadeiras pérolas que beiram o inacreditável. Os mais sensíveis vão achar o filme uma coleção de baixarias, mas Baker e suas meninas conduzem a sessão com tanta energia que é impossível não gargalhar com o que se vê na tela. Enquanto Kiki mostra-se uma desvairada de primeira ao caçar a amante do namorado em toda parte, Alexandra mostra-se mais contida, deseja deixar aquela vida para trás e ser cantora - para tanto, considera sua apresentação num bar na noite de natal algo que pode mudar sua vida. Ao redor das personagens ainda gravita o motorista de táxi Razmik (Karren Karagulian, ator favorito do diretor), que é casado e com filhos, mas que possui forte atração pelas transexuais. O que poderia se tornar um filme sórdido, torna-se uma pequena aventura pelas ruas de Los Angeles na noite de natal, destacando a compaixão com que o diretor filma seus personagens. Bem humorado, Tangerine lembra um pouco os primeiros filmes de John Waters (que alçou ao estrelato a drag Divine) e bastante os primórdios de Pedro Almodóvar, com suas personagens extravagantes. No ano em que a assepsia de A Garota Dinamarquesa caiu nas graças da Academia, Tangerine encontrou abrigo no Independent Spirit Awards (onde concorreu a quatro prêmios: filme, diretor, atriz/Kiki e ganhou o de melhor atriz coadjuvante para Mya), mas está longe de ter a pretensão de desvendar a identidade trans, seu foco recai mesmo sobre os bastidores de uma cidade que vende glamour e sonhos, mas que esconde personagens interessantes à sua margem. Sucesso em festivais de cinema independente, Tangerine também ganhou notoriedade por ter sido totalmente gravado com iPhones (e a imagem foi melhorada depois), mas o que poderia ser um detalhe torna-se um recurso notável para sua realização, afinal, para além do belo trabalho de cores que vemos na tela, existe uma mobilidade impressionante na captura das cenas mais agitadas. Ao final, o filme revela-se um conto sobre a solidão em contraponto com a amizade, ainda que cheia de tropeços, de Sin-Dee (Rella, oras!) e Alexandra. 

Tangerine (EUA-2015) de Sean Baker com Mya Taylor, Kiki Kitana Rodriguez, Karren Karagulian e James Ransone. ☻☻☻

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