quinta-feira, 20 de agosto de 2015

PL►Y: Acima das Nuvens

Juliette e Kristen: o paradoxo cinematográfico de Olivier Assayas. 

Uma amiga disse que havia assistido Acima das Nuvens e não sabia me dizer o que tinha achado do filme. Isso me deixou curioso... Mary Enders (Juliette Binoche) é uma atriz consagrada que viaja junto à assistente, Valentine (Kristen Stewart), para uma homenagem ao diretor que a descobriu quando era apenas uma estreante de dezoito anos no filme "Maloja Snake". No meio da viagem de trem, ela precisa lidar com a preparação de seu discurso, com os preparativos para o divórcio e, um pouco depois, com a notícia de que o homenageado acaba de se suicidar. Diante de tantas perdas, Mary será convidada para atuar na versão teatral do filme que a consagrou, mas dessa vez, não fará o papel da jovem, mas da mulher mais velha que se apaixona por ela. De início, Mary não se empolga com o convite, mas como não lhe oferecem muitos papéis interessantes, ela aceita - e isso a fará mergulhar em várias angústias pessoais. A partir daí, o cineasta Olivier Assayas constrói uma história que torna-se um paradoxo, por ser simples e complexa ao mesmo tempo - afinal, durante toda a sessão, a vida de Mary parece se misturar com o texto da peça que irá encenar. Mary apresenta problemas sérios em mudar seu ponto de vista junto à personagem que lhe cabe agora, além disso, enfrenta o espectro de sua antiga parceira de cena que faleceu num acidente de carro pouco depois das filmagens. Para Mary, sua nova personagem simboliza o fracasso diante da velhice. Quem tenta fazer Mary lidar com os do passado fantasmas é a jovem Valentine, que tenta fazer a estrela mudar seu olhar sobre a personagem. Para além de Mary lidar com o novo papel, ela também precisa lidar com a passagem do tempo, do tempo em que estava no centro dos holofotes e agora precisa lidar com convites para fazer filmes de super-heróis - e ficar suspensa em cabos de aço diante de uma tela verde (coisa que ela mesma considera estar um tanto velha para isso) - ou filmes de terror sangrentos. Além disso, precisa lidar com um tempo em que a notoriedade extrapola a interpretação e ganha novas dimensões com a internet e os escândalos de sua co-estrela, Jo Anne Ellis (Chloe Grace Moretz). Ainda que não seja um filme do qual se gosta fácil, Assayas constrói uma dinâmica interessantíssima entre suas personagens, não apenas com o que se vê na tela, mas também com os signos que representam fora dela - e isso tem efeito ainda maior quando vemos Kristen Stewart dizendo frases que são quase defesas diante do que o mundo pensa sobre dela. Ver Juliette Binoche dizendo à estrela de Crepúsculo que "não basta dizer um texto, é preciso vivê-lo" soa como provocação para a atriz criticada por sua apatia cênica. Não por acaso, desde que foi exibido em Cannes no ano passado,  Kristen foi a ponta mais elogiada do elenco, nem tanto por sua atuação (que consegue até ser eficiente) e mais pela forma como encara o exercício metalinguístico proposto pelo cineasta (e no qual a última cena de Valentine é um toque genial na percepção do olhar que Mary tem sobre a peça - e a plateia costuma reclamar...). Pela tarefa, Kristen ganhou o César (o Oscar francês) de atriz coadjuvante pelo papel. Outro destaque do filme são as locações em Sills Maria, uma área montanhosa da Suíça onde a formações das nuvens provocam um espetáculo à parte e que complementa com grande beleza esse olhar de Assayas sobre o mundo das celebridades. A beleza efêmera das nuvens no desfiladeiro parece lembrar o tempo inteiro à Mary os seus maiores medos diante da carreira e da imagem que lhe são tão valiosas. Pelos desdobramentos que permanecem em nossa mente por vários dias, o filme surpreende. 

Acima das Nuvens (Clouds of Sils Maria/ França-Alemanha-Suíça/2014) de Olivier Assayas com Juliette Binoche, Kristen Stewart, Chole Grace Moretz, Johnny Flynn e Brady Corbet. ☻☻☻☻

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