domingo, 28 de setembro de 2014

Na Tela: Frank

Maggie, Fassbender e Gleeson: música, amizade e loucura.

Nenhum filme anunciado para o Festival do Rio 2014 me fez salivar tanto quanto Frank. Se você acompanha o blog sabe que o estranho filme estrelado por Michael Fassbender estava na minha lista de prioridades do segundo semestre - mesmo sem ter data para estrear nos cinemas tupininquins (possivelmente o fará quando a produção figurar nas premiações de fim de ano). Exibido nesse final de semana, Frank é inspirado no personagem criado pelo inglês Chris Sievey (1955-2010), um músico e comediante que se escondia debaixo de uma cabeça gigante feita de papel machê para cantar à frente da banda Freshies no final dos anos 1970 e início dos anos 1980. Na pele, quero dizer, na cabeça de Frank Sidebotton, Chris dava um toque de nonsense no mundo da música pop e muitos percebiam ali uma ironia com o culto ao mundo das celebridades que ainda engatinhava. No entanto, Chris tinha uma vida própria sem aquela cabeça, realizando trabalhos para a televisão (inclusive na produção do desenho Pingu que fez muito sucesso no Brasil). O escritor Jon Ronson (de Homens que Encaravam Cabras/2009) era amigo de Chris e chegou a tocar com ele durante o período em que a banda existiu, portanto, era de se imaginar que convites para escrever um filme Frank o perseguia há um bom tempo. Ronson chegou a conversar com Sievey sobre o filme, mas Sievey pediu para não fazer uma biografia não convencional, mas que criasse uma história sobre o personagem que, aproveitasse a mitologia que girava em torno de sua identidade secreta. Esse foi o caminho seguido por Ronson, no roteiro com tons de comédia que flerta com o surrealismo e caminha para uma abordagem psicológica sobre o processo criativo, amizade e loucura. Ambientado nos tempos atuais (com a ajuda das redes sociais para divulgar o mito de Frank), o filme é narrado por Jon (Domhnall Gleeson, um bom ator saído da série Harry Potter), um rapaz insatisfeito com o trabalho e que percebe que sua carreira musical precisa de um empurrão gigantesco! É meio que por acaso que ele cruza o caminho de Frank, que enfrenta problemas sérios com o tecladista de tendências suicidas. Jon passa a tocar teclado na banda e fica instigado com aquele personagem cabeçudo que é o líder da banda - isso enquanto escuta histórias sobre Frank nunca tirar o cabeção e ter criado a banda depois que saiu de um sanatório. A banda faz o estilo psicodélico experimental (coisa que Jon irá descobrir com mais ênfase quando participar do interminável retiro da banda para gravação do primeiro disco), mas é perceptível como a música, assim como a cabeça, serve para o homem que se esconde ali comunicar-se com o mundo... ou seria proteger-se? O diretor Lenny Abrahamson compõe o filme com leves esquisitices que podem fazer rir e incomodar a plateia, principalmente quando está em cena a estranha banda. Maggie Gyllenhaal está ótima como (a quase psicótica) Clara (fiel escudeira do vocalista e que merece o Oscar de mal humorada do ano) e bem acompanhada por François Civil e Carla Azar que recebem menos destaque, mas ajudam a compor um painel interessante sobre músicos à procura da sonoridade perfeita. Com a chegada de Jon o equilíbrio do grupo entra em risco enquanto Frank terá que se esforçar para não perder o controle. O filme começa com cara de comédia e aos poucos aprofunda o drama do seu personagem defendido com brilhantismo por Michael Fassbender! As cenas finais, onde nos é revelado quem é o verdadeiro Frank, conseguem ser comoventes sem ser piegas e culmina numa das cenas musicais mais desconcertantes do cinema, uma declaração de amor mútua na simbiose de duas canções bem diferentes em seu som e doses de fúria. Frank pode não ser para todos os gostos (principalmente por seguir a cartilha do humor inglês e não hollywoodiano), mas funciona como uma bela homenagem a um artista que queria promover às plateias uma estimulante dose de estranhamento. 

Frank (Reino Unido/2014) de Lenny Abrahamson com Domhnall Gleeson, Michael Fassbender, Maggie Gyllenhaal, Scoot McNairy, François Civil e Carla Azar. ☻☻☻☻

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