segunda-feira, 18 de novembro de 2013

DVD: O Que Traz Boas Novas

Alice e Lazhar: refletindo sobre a morte. 

Apesar de todos os problemas que afetam a educação eu ainda considero que o trabalho em uma escola tem uma magia que nenhum outro espaço pode proporcionar. Acho fascinante perceber as identidades dos alunos sendo construídas e a forma como professores e alunos podem influenciar essa construção de forma positiva (e até negativa). Talvez por perceber a escola como um espaço de construção, as primeiras cenas de O Que Traz Boas Novas tenha me deixado tão chocado. O filme não tem floreios ao mostrar os efeitos do suicídio de uma professora dentro do espaço escolar, especialmente quando a estratégia é evitar falar sobre o assunto. É como se todo aquele ambiente que parece seguro e de regras tão claras fossem destruídas no mesmo instante. Talvez isso seja um reflexo da própria sociedade, sempre com dificuldades em lidar com as perdas, que são consideradas como verdadeiras derrotas. Essa lógica tão presente em nossa sociedade ocidental recebe um olhar diferenciado no filme quando aparece o argelino Bachir Lazhar (Mohamed Fellag) para assumir a turma da finada professora. É verdade que existe um choque quando o professor aparece no universo dominado por mulheres, aumenta ainda mais esse efeito a visão mais conservadora sobre a educação. Cadeiras enfileiradas? Balzac para crianças? Cascudo? Aos poucos os alunos aprendem a lidar com esse professor diferente, ao mesmo tempo que ele aprende a lidar com seus pupilos. O mais interessante no elogiado filme de Phillippe Falardeau é como ele mostra uma escola um tanto engessada, mesmo em sua prática pedagógica progressiva. Mais do que pelo suicídio (que parece assombrar mais os adultos do que as crianças), um ambiente tão repleto de emoções aparece sufocando-as com a proibição de contato físico  (abraços estão terminantemente proibidos) e de abordar assuntos que incomodam. O diálogo sobre a morte parece exclusividade da psicóloga, que nunca conversa muito bem com Lazhar sobre a forma como os alunos estão lidando com a situação. Na classe de Lazhar dois alunos merecem destaques, a madura Alice (Sophie Nélisse) e o provocador Simon (Émilien Néron), ambos parecem dividir um segredo sobre os acontecimentos que precederam o suicídio da professora (além de serem os únicos alunos que viram o corpo antes de ser retirado do local). Esses, sobretudo, sentem o benefício do olhar estrangeiro do novo mestre, especialmente na forma como ele os ajuda, dentro dos meios possíveis a lidar com a perda da professora de forma tão repentina. Talvez por ter sido casado com uma professora e ter sua própria cota de dramas pessoais (que inclui a busca pela autorização de morar no Canadá), Lazhar veja na escola um espaço quase sagrado. A catártica cena em que Simon desabafa sobre sua culpa é um bom exemplo disso. Negando a sala de aula como um espaço para "transbordar seu desespero", Lazhar com todo o o seu conservadorismo parece o porto seguro, uma rocha sólida em que as crianças podem se apoiar enquanto esperam as nuvens pesadas se afastarem da escola. Não se trata de um discurso pró-conservador sobre educação, mas como a personalidade de um professor influência no desenvolvimento de uma classe. A direção de Falardeau é precisa. Sem excessos, nos torna observadores daquele universo, nos aproxima do olhar de Lazhar sobre aquela nova cultura (acha um absurdo as crianças terem que aprender duas línguas simultaneamente) e as pequenas violências daquele espaço. Além disso, o filme nos assusta com as atuações vigorosas dos pequenos Sophie e Émilien diante da morte como um tabu. Extremamente terno, O Que Traz Boas Novas (o significado do nome do professor) é uma pequena obra-prima que merece seu lugar entre melhores filmes sobre a relação entre professores e alunos, talvez por isso tenha sido indicado a vários prêmios, incluindo o Oscar de filme estrangeiro em 2012 (o qual perdeu para Separação ao lado de Bullhead e Nota de Rodapé). O filme nos faz pensar mais do que na educação, mas na forma como as relações humanas podem ser formativas.

O Que Traz Boas Novas (Monsieur Lazhar/Canadá-2011) de  Phillippe Falardeau com Mohamed Fellag, Sophie Nélisse, Emilien Néron e Brigitte Poupart. ☻☻☻☻

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