quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

DVD: Cosmópolis

Giamatti e Pattinson: livro interessante, filme nem tanto...

O livro Cosmópolis de Don DeLillo, desde que foi lançado em 2003 é cultuado por muitos pela forma irônica como enxerga a economia mundial contemporânea. Repleta de alfinetadas no sistema capitalista, a história do empresário Eric Michael Packer é apenas o pano de fundo para uma analogia acidamente cômica sobre uma sociedade repleta de informações, especulações, temores e pessoas que fazem mais dinheiro do que são capazes de gastar. Dá para perceber que David Cronenberg é fascinado pelas reflexões que o livro propõe ao leitor, tanto que mantém o texto bastante literário na boca de seus atores. O problema é que sob a tutela do leitor, ele ganha o ritmo e o tom subjetivo de cada um. Filmado e projetado numa tela, ficamos sujeitos ao olhar de um cineasta sobre aquela obra. Não é o meu olhar sobre o livro, não é o seu e nem do autor, trata-se do olhar de Cronenberg sobre o dia em que Packer resolve cortar a cidade em sua limusine para cortar o cabelo e dá o azar de ser o mesmo dia em que o presidente resolve visitar a cidade. O resultado? Um dia inteiro cruzando os bairros para poder cortar o cabelo e o encontro com uma série de personagens que podem ser curiosos no livro, mas que no filme deixa tudo vago demais. Acho difícil que o filme ganhasse projeção na mídia se não contasse com a presença de Robert Pattinson no papel de Packer. No papel, o moço ainda mostra-se esforçado, sem fraquejar em cenas ousadas, como aquela em que conversa com uma amiga enquanto faz um exame de próstata dentro de sua limusine. Na pele de Packer ele consegue ser bastante convincente. Em sua limusine ele consegue transmitir a ideia de que vive num universo bastante particular. Blindado e a prova de som, ali dentro Packer consegue ficar imune aos protestos e manifestações que deixam seu motorista/segurança sempre em estado de alerta às ameaças iminentes. O problema do filme está na necessidade de Cronenberg reverenciar o livro e esquecer que o espectador pode não se interessar por seu filme palavrososamente pretensioso. O flerte com o caos consegue despertar a curiosidade no início, mas começa a ficar desinteressante com as atuações quase mecânicas do elenco. Percebo que a culpa não é deles, agora virou moda entre os diretores metidos a moderninhos fazer filmes frios, distantes e inexpressivos como uma espécie de "crítica ao sistema que está aí", mas penso que essa opção já deixou de ser cacoete estilístico e já virou um clichê dos mais chatos dos últimos tempos. Não há dúvidas de que o texto de DeLillo é interessante, existem diálogos soberbos como a especulação sobre o tempo em que os ratos serão a moeda corrente ou as divagações sobre a forma como lidamos com a informação (sempre cm Packer indagando essas questões aos mais novos, como se ele mesmo fosse ultrapassado antes dos trinta anos), mas em momento algum o diretor consegue transformar esse brilhantismo escrito em imagens compatíveis. Os personagens entram e saem sem que possamos nos envolver com eles - e olha que estamos falando de coadjuvantes do porte de Julliete Binoche, Paul Giamatti, Samantha Morton e Mathieu Amalric. O maior peso fica mesmo para os ombros pálidos de Pattinson.   Consigo até admirá-lo por sua audácia em topar fazer um papel tão difícil, com cenas perigosas eme que suas fãs de Crepúsculo não estarão preparadas para admirar nem daqui há duzentos anos. Cenas desagradáveis, como a que descobre que tem uma próstata assimétrica ou em que atira em sua própria mão, parecem estar ali só para dizer que o garoto não tem medo de fazer papel de gente grande. Sua atuação me pareceu uma versão repaginada e tolhida do festejado Psicopata Americano (2000) de Christian Bale - pena que o esforço de Pattinson seja em vão num filme que procura valorizar um texto tão aberto a reflexões num longa tão fechado em si mesmo. Porém, percebi algumas cenas que parecem anunciar que, depois de uma década de filmes comportados, Cronenberg está prestes a voltar a revirar nossa resistência estomacal. 

Cosmópolis (EUA-França-Itália-Portugal/2012) de David Cronenberg com Robert Pattinson, Kevin Durand, Juliette Binoche, Paul Giamatti, Jay Baruchel, Mathieu Amalric, Sarah Gadon e Samantha Morton. 

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