domingo, 8 de abril de 2012

CATÁLOGO: O Diabo Veste Prada

Meryl: o melhor diabo de todos os tempos.

Anne Hathaway é uma das atrizes mais celebradas em Hollywood e boa parte dos seus méritos foram exaltados quando estrelou a adaptação do livro de Lauren Weisberger sobre o período em que trabalhava na Vogue americana - comendo o pão que Anna Wintour amassou. No livro e no filme Anna se chama Miranda Priestley, uma diva em toda a abrangência do termo: rabugenta, exigente, megera, luminosa, mimada e esperta como poucas mortais ousam ser. Dizem que o filme aliviou bastante a personalidade difícil da personagem, mas a verdade é que torna-se impossível não admirar uma figura feminina tão forte com todos os seus prós e contras, a Miranda do filme ainda tem uma vantagem desleal com a do livro: a atuação de Meryl Streep. O mais curioso é que Meryl pode ser ultrafamosa e premiada, mas nunca foi um ícone da moda, pelo contrário, seu visual é muitas vezes mais despojado do que qualquer outra coisa - e quando se arruma opta pelo clássico mais convencional - no entanto, ela compõe uma Miranda arrasadora, das madeixas brancas ao equilíbrio em saltos vertiginosos. A composição de Meryl é tão vibrante que fica difícil até considerá-la como vilã que atormenta a vida de suas secretárias, ela pode até ser uma chata, mas não chega a ser o que o título se anuncia. Miranda é a editora da conceituada revista Runway e recebe como nova assistente a jovem Andrea Sachs (Hathaway), que como seu figurino deixa perceber, acha o mundinho fashion bem fútil - ao contrário da secretária de Miranda, Emily (uma divertida Emily Blunt, na atuação de sua vida). É inevitável que exista uma rivalidade entre Andy e Emily para garantir a atenção de Priestley e, ao mesmo tempo, não demora para que Andy se sinta um peixe fora d'água com toda a propriedade com que a poderosa redatora consegue vender o seu peixe do mundo da moda (a cena em que Miranda transforma uma combinação inusitada de saia rosa e volumosa e jaqueta  com o acréscimo de um cinto chega a ser mágica). Sorte que Andy consegue um fado padrinho, Nigel (Stanley Tucci, num personagem que funciona tão bem que chegou a repetí-lo no tolo Burlesque/2010) que irá transformá-la numa autêncica garota Runway. Mas isso não basta para que a assistente satisfaça todos os desejos de Miranda - que inclui até conseguir o manuscrito original de um novo exemplar de Harry Potter - e de seu namorado (o irritante Adrian Grenier) que se sente cada vez mais em segundo plano. O filme é um grande acerto em retratar o mundo da moda pelos olhos de uma mera mortal, todas as grifes e estilistas são mencionados exaustivamente, mas dentro de um contexto bem construído onde o que está em jogo são as relações entre os personagens e a sensação de que o glamour e o estilo causam uma impressão que desaparece assim que chegamos em casa - e isso serve para garotas como Andrea ou divas como Miranda (que mostra-se desconfortável quando seu universo particular de crises conjugais é descoberta por Andrea). Existem intrigas e piadas com o universo fashion (como a careta de Miranda quando algo a desagrada e a cena em que Emily confessa que sua dieta consiste em "quando sinto que vou desmaiar, como um pedaço de queijo") e muitos atrativos que deixaram a mulherada alucinadas com o filme, mas debaixo de tudo isso, existe uma alegoria simples, ainda que eficaz sobre vender a alma para o seu ofício. Aquela ideia de abandonar tudo, seus amores e planos numa jornada que pode parecer sem volta e tornar-se aquilo que você mais temia. É essa decisão que Andrea terá de tomar após ver Miranda sem sua máscara diária e ver-se refletida num espelho de cristal. Ritmo preciso, edição bem cuidada, fotografia de catálogo, trilha sonora sem modernices e atuações inesquecíveis garantiram o sucesso do filme. É filme pipoca da melhor qualidade que prova que o cinema ainda pode ser pop sem perder a qualidade! Meryl foi premiada com o Globo de Ouro (de atriz de comédia) e recebeu uma indicação ao Oscar. Emily Blunt também foi lembrada na categoria coadjuvante no Globo de Ouro e Anne Hathaway teve que se contentar em ser ofuscada pelas duas, sua indicação ao careca dourado só viria depois com O Casamento de Rachel (2008) - que comprovou que ela é muito mais interessante quando não fica sorrindo o tempo todo diante da câmera, ou simplesmente liberta seus diabinhos interiores.     

O Diabo Veste Prada (EUA-2006) de David Fankel com Anne Hathaway, Meryl Streep, Emily Blunt, Stanley Tucci,  Adrian Grenier, Simon Baker e Gisele Bündchen. 

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