quinta-feira, 22 de março de 2012

KLÁSSIQO: Domingo Maldito

Glenda Jackson: um dos abraços mais calorosos do cinema.

Com dois Oscars de melhor atriz na estante (por Mulheres Apaixonadas/1970 e Um Toque de Classe/1974), a inglesa Glenda Jackson foi uma das maiores atrizes de sua geração. Eu não conhecia muito o trabalho da atriz, mas fiquei apaixonado por ela quando vi recentemente sua atuação em Domingo Maldito, filme que lhe rendeu o BAFTA de melhor atriz e sua terceira indicação ao prêmio da Academia de Hollywood. Além da indicação da atriz, o filme concorreu a outras três estatuetas (direção, roteiro e ator para Peter Finch) e não ganhou nenhuma. É mais do que compreensível, já que o filme retrata um tema polêmico, ainda que com muita dignidade e discrição. O filme conta a história de um triângulo amoroso formado por Alex (Glenda Jackson), Daniel (Finch) e o jovem Bob (Murray Head). O filme começa quando Alex (o nome unissex é proposital)  aceita tomar conta de umas crianças ao lado de Bob durante um final de semana. Alex é espirituosa, atraente e desencanada como muitas almejavam ser ser no início da década de 1970. Os casal parece brincar de casinha numa espécie de ensaio para a convenção social do casamento - tendo como momento de privacidade somente os que estão no quarto. Entre as tarefas do lar e a simulação de papéis sociais tradicionais que se espera de um casal, as cenas da dupla são cortadas por cenas do cotidiano do médico Daniel Hirsch. Não fica muito clara a relação que os três personagens possuem, até o dia em que Bob sai da casa para um encontro e deixa a namorada sozinha. Visivelmente enciumada ela nem menciona o nome da pessoa com quem Bob irá se encontrar, é quando percebemos que Bob se divide entre Alex e Daniel, com o consentimento de ambos. Trata-se menos de uma aceitação e mais do medo de perdê-lo que faz com que ambos amantes concordem com esse relacionamento. Não demora para que Bob volte para Alex e voltem a viver seu final de semana de família convencional. O trunfo do roteiro está em lidar com as simbologias de atos cotidianos simples, mas impregnados de significados. Não é por acaso que depois do final de semana brincando de casinha, Alex começa a ver seu relacionamento amoroso com outros olhos e outro sentimento começa a ganhar força dentro dela: a solidão. Ainda que viva momentos tórridos com seu parceiro, Alex percebe que quer algo mais, algo que seu rival Daniel pode até imaginar, mas que os preconceitos e reservas pessoais fazem com que prefira frequentar jantares da família desacompanhado e aguente ser apresentado por mulheres as quais jamais lhe despertarão interesse. John Schlesinger mostra-se um diretor de mão cheia para miudezas das relações humanas e um mestre em construir pessoas complexas diante da câmera (características que gerou o oscarizado Perdidos na Noite/1969) . Por mais simpático que seja, Bob não parece se importar muito com nenhum de seus parceiros, mesmo se relacionando com os dois parece estar sempre preocupado com si mesmo e suas vontades (como a viagem à Nova York, que faz com que seus amantes tenham que lidar com a sensação infeliz de perdê-lo), já Alex começa a desejar alguém sempre por perto enquanto Daniel parece acostumar-se à solidão. Acho que muita gente deve torcer o nariz quando assistir ao filme nos dias de hoje, mas é impossível ficar indiferente às transformações pelas quais passa os personagens durante a semana em que os fatos são narrados. Apesar do trio ser afiado, eu confesso que a Alex de Glenda foi a vértice que mais me chamou a atenção, com seus olhares e sorrisos é mais do que compreensivo porque num momento decisivo, Bob a convida para prosseguir com ele. É neste ponto que Glenda alcança um dos momentos mais brilhantes de sua carreira onde os sentimentos contraditórios compõem cada célula interpretativa de seu corpo. Depois desse filme, Glenda concorreu ao Oscar de atriz mais uma vez por Hedda (1975) ao interpretar a clássica personagem de Ibsen. Só para lembrar, vendo o filme é inacreditável que Schlesinger tenha voltado a abordar um relacionamento entre uma mulher hetero e um homossexual no fraco Sobrou para Você estrelado por Madonna e Rupert Everett (2000).

Domingo Maldito (Sunday Bloody Sunday/Reino Unido-1971) de John Schlesinger com Glenda Jackson, Peter Finch e Murray Head. 

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