sexta-feira, 23 de março de 2012

CATÁLOGO: Olhos de Serpente

Russo e Madonna: filmagem dos horrores. 

Sei que um bando de pessoas vão chegar até esta postagem procurando algo sobre o filme de Brian de Palma estrelado por Nicolas Cage, para esses devo dizer que o filme em questão é outro: o dirigido pelo controverso Abel Ferrara, Sempre tive curiosidade pelo filme (ainda mais agora que um bando de cineastas resolveram achar que um ator não deve interpretar, mas viver a cena da forma mais real possível) e alguns críticos chegaram a elogiar a atuação da atriz na época o que é algo raro, já que estamos falando de Madonna! Sei que parece inacreditável, mas realmente ela colheu alguns elogios pelo filme, o que não evitou que ele fosse o maior fiasco de sua carreira como atriz - rendeu pouco mais de 72 mil dólares (acho que nem os cenários custaram isso) o que colaborou muito para que fosse esquecido. Agora, com o lançamento de W.E. (segundo filme dirigido pela popstar) pipocaram cinebiografias da loura e este voltou a ter seus quinze segundos de fama (minutos já me parece exagero). Ferrara é um cineasta que adora polêmicas, seus filmes se concentram especialmente no choque entre o consumo de drogas, religião e violência, mas nada que lhe atribua adjetivos melhores do que um Scorsese de terceira categoria. Olhos de Serpente parte até de uma premissa interessante, mas estraga tudo (por coincidência) pelo mesmo problema de Madonna em W.E., conta duas histórias distintas, mas que não colam nem com superbonder! Com a ideia de mostrar um filme dentro do filme, Ferrara dá um show de pretensão ao criar um retrato sombrio de Hollywood, com o bastidor descontrolado da filmagem de um roteiro pesado. Por algum mistério do universo Harvey Keitel foi considerado o melhor ator de Veneza em 1993 pelo papel do cineasta Eddie Israel, que filma em Los Angeles com o problemático astro Francis Burns (James Russo) e a estrela em ascenção Sarah Jennings (Madonna). Os atores dão vida a um casal em crise, tudo por conta da redenção religiosa de Sarah após uma vida de excessos com drogas e sexo. Enquanto Francis é o tipo de ator que foge da técnica, do método e de qualquer outra coisa que não seja seu descontrole ao improvisar, Sarah é seu total oposto, chegando a se irritar com ele diversas vezes durante as filmagens. Essa tensão só aumenta e o diretor Israel alimenta isso, sem perceber que está criando um grande problema. Enquanto o filme retrata o casal em crise sobra tensão nos exageros utilizados por Ferrara, mas quando o espectador  está imerso naquele conflito angustiante, existe o corte que nos direciona para a vida dos bastidores. O efeito é de um balde de água fria, porque ao contrário do que Ferrara pensava, o que seu alter-ego tem a dizer não é interessante, ao contrário, é apenas irritante. Alimentando a raiva de Burns com todos os clichês que se pode imaginar (a pressão dos produtores, sua decadência artística, a  competitividade com uma estrela em ascensão, o cronograma de filmagens, o affair que acontece entre o diretor e sua atriz...) a vítima dessas investidas acaba sendo Sarah (principalmente nas cenas mais violentas que o seu papel exige), ao ponto de quase acontecer um estupro diante da câmera. O mais curioso é que embora não seja uma atriz de prestígio, Madonna consegue dar conta de sua personagem com muita dignidade - claro que se Ferrara tivesse mais cuidado com os diálogos tudo seria muito melhor. O filme foi um dos primeiros filmes produzidos pela produtora de Madonna,  a Maverick Films e ela fez questão de falar mal dele quando chegou aos cinemas. Existe um motivo pessoal para isso (além de toda a pretensiosa mediocridade do longa), Madonna sofreu um abuso muito semelhante ao que vemos no filme no período em que tentava a vida como estudante de dança em Nova York, o filme mexeu em suas feridas. Seu nervosismo na cena em que conta o abuso sofrido nas filmagens com Francis Burns é evidente por tiques nervosos. Ferrara tentou contar dois filmes em um só, mas seu olhar sobre os personagens é mais interessante do que quando começa a reclamar da vida de cineasta (ora, porque não vai vender batatas?). Com cenas fortes de violência contra a mulher, ironicamente, são elas que tentam salvar o filme de um bando de fiapos masculinos (até a esposa de Abel, Nancy Ferrara, tem  um momento luminoso onde lava a roupa suja com o personagem de Harvey Keitel). Ferrara deveria procurar outra forma de exorcisar seus fantasmas.

Olhos de Serpente (Dangerous Game/EUA-1993) de Abel Ferrara com Harvey Keitel, James Russo, Madonna e Nancy Ferrara. 

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