quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

COMBO: Elas mereciam o Oscar

Ainda em clima de ressaca de Oscar, não foi desta vez que Glenn Close realmente ganhou o seu reconhecimento pela Academia. Indicada pela sexta vez ao prêmio (sua primeira indicação fora da década de 1980) a atriz não ganhou sua estatueta por Albert Nobbs. Ao longo dos anos a Academia tem deixado de premiar atores que ajudam a elevar o status das produções do cinema americano, obviamente que existem diversos fatores para isso - e sempre existirão os prêmios especiais para os equecidos ao longo dos anos. Além de Close, Sigourney Weaver, Samantha Morton e Michelle Pfeiffer engrossam uma vasta lista de atrizes que mereciam ter um Oscar na estante. Destaco neste combo cinco performances que já mereciam ter garantido às suas intérpretes um careca dourado em casa!

5 Asas do Amor (1997) O filme romântico de Iain Softley rendeu a primeira indicação ao Oscar de Helena Bonham Carter. Baseado na adaptação do aclamado romance de Henry James, Helena nem sonhava em ser a senhora Tim Burton quando teve a descomunal performance como a oportunista Kate Croy, que arma o namoro de seu amante (Linus Roache) com uma herdeira adoentada. Os conflitos gerados por essa situação bem que poderiam ter rendido o prêmio para a atriz - que foi derrotada por Helen Hunt por Melhor é Impossível. Helena só conseguiu outra indicação ao Oscar no ano passado como coadjuvante em O Discurso do Rei (que lhe rendeu o BAFTA), mas bem que merecia outras pela maluquete Marla Singer (Clube da Luta/1999), pela Srª Lovett (Sweeney Todd/2007) e por salvar os piores filmes do seu esposo na pele da macaca Ari (Planeta dos Macacos/2001) ou a Rainha Vermelha de Alice (2010). Apesar de famosa por papéis esquisitos, a atriz já provou que pode fazer todo tipo de personagem.

4 O Sexto Sentido (1999) A australiana Toni Collette é uma camaleoa e coleciona inúmeros papéis interessantes - mas apenas uma indicação ao Oscar, pelo seu papel de coadjuvante neste sucesso estrondoso de M. Night Shyamalan. No papel da mãe do menino que vê gente morta, Toni tem momentos inesquecíveis. Seja com os sustos pelas situações inexplicáveis que o menino se mete ou pela tocante cena do carro ao final da sessão. A performance de Toni me comoveu mais do que a psicótica de Angelina Jolie em Garota, Interrompida - que acabou levando o prêmio daquele ano. Porém, a Academia já poderia ter se rendido ao talento da atriz desde que apareceu para o mundo no inesperado sucesso de O Casamento de Muriel (1994), ou pela depressiva Mandy Slade de Velvet Goldmine (1999), pela marcante participação em As Horas (2002), pela mãe de Pequena Miss Sunshine (2006) ou como a vizinha grávida do polêmico Tabu (2007).

3 A Família Savage (2007) Aclamada por sua atuação no seriado The Big C, Laura Linney já provou ser uma atriz de muitos recursos e a cada filme demonstra ser melhor! Sua última indicação ao Oscar de atriz foi na pele de Wendy Savage - uma escritora que vive uma bagunça emocional (enquanto aguarda o financiamento para uma obra, envolve-se com um homem casado e lava a roupa suja com o irmão intelectual quando buscam um asilo para o pai que está ficando senil). Linney pega essa personagem complicada e a transforma numa mulher adoravelmente humana.  Linney acabou perdendo o Oscar para a assombrosa Marion Cotillard (Piaf) - mais uma derrota para sua coleção, já que concorreu anteriormente como a devotada irmã de Conta Comigo (2000) e a esposa moderninha de Kinsey (2004). Laura ainda merecia indicações por O Show de Truman (1998), A Lula e a Baleia (2005), Sobre Meninos e Lobos (2003) e pela dondoca de Diário de Uma Babá (2001).

2 Beleza Americana (1999) Quando vi Annette Bening no filme de estreia do diretor Sam Mendes eu achei que ela finalmente ganharia o Oscar, mas acabou perdendo para Hillary Swank (Meninos não Choram), o que considero ainda hoje uma injustiça! A senhora Warren Beatty está fascinante como a senhora Susan Burnhan que tenta viver o sonho americano enquanto enfrenta uma crise no casamento e na vida profissional. Enquanto o esposo parece voltar para a adolescência, Susan o trai com um concorrente no ramo imobiliário, ouve fitas motivacionais e se matricula e aulas de tiro. Há quem considere sua atuação caricata, mas acho que esses não entenderam a proposta do filme, que descasca arquétipos como se fossem cebolas. Não entendeu? Então confira a cena em que Annette despe sua personagem de toda sua armadura ao final - é arrepiante! Bening já havia concorrido ao Oscar anteriormente por Os Imorais (1990) e depois voltou ao páreo com Adorável Julia (2004) e Minhas Mães e Meu Pai (2010). Ainda não entendo como ela ficou de fora em 2007 quando foi a mãe desequilibrada de Correndo com Tesouras ou como a amarga mulher de Vidas Cruzadas (2009).

1 Boogie Nights (1997) Acho que Julianne Moore se tornou uma dessas atrizes que achamos que já ganhou um Oscar e pronto, ela nem precisa ganhar um de fato! Seu primeiro reconhecimento pela Academia veio como a diva pornô do segundo filme de Paul Thomas Anderson. Merecidamente indicada ao prêmio de coadjuvante, Julianne está indescritível como Amber Waves, uma mulher divorciada que tenta conseguir a guarda da filha enquanto lida com a decadência do cinema pornô na década de 1970 - e sua mistura de festas, discoteca, drogas e a formação de uma família incomum ao lado de outros profissionais do gênero. Moore se transforma na pele de sua personagem e boa parte da nação cinéfila considera que ela merecia o prêmio mais do que Kim Basinger (Los Angeles: Cidade Proibida). Julianne ainda foi lembrada por suas atuações em Fim de Caso (1999), As Horas (2002) e Longe do Paraíso (2002), mas ela ainda merecia indicações por A Salvo (1995), O Grande Lebowski (1998), Magnólia (1999), Ensaio sobre a Cegueira (2008), Direito de Amar (2009), Minhas Mães e Meu Pai (2010) e, (ufa!) pela comédia Amor a Toda Prova (2011). Com um currículo desses, acho que até a Academia pensa que ela já tem um Oscar em casa!

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

GANHADORES DO OSCAR 2012


Plummer, Spencer, Streep e Dujardin: ninguém pareceu mais surpreso que Meryl!

Não sei se a volta de Billy Cristal empolgou muito neste ano de Oscar, mas o apresentador teve algumas tiradas ótimas - especialmente quando interagia com os comentários dos filmetes apresentados ou provocava a plateia com tiradas perigosas. O cenário se rendeu à nostalgia dos favoritos deste ano (O Artista e A Invenção de Hugo Cabret que ganharam cinco estatuetas cada). Também achei engraçado o dueto Emma Stone e Ben Stiller - e até Gwyneth Paltrow e Robert Downey Jr brincando de Reality Show no palco. Mas o que mais me chamou atenção foi a duração da festa: 3 horas e poucos minutos de duração. Um recorde conquistado com uma certa pressa nas categorias menos badaladas e menos homenagens. Histórico mesmo foi Meryl Streep ter ganho o Oscar de  atriz, sua terceira estatueta em 16 indicações. Além de artista recordista em indicações ela acaba de empatar com Jack Nicholson no número de estatuetas (o recorde ainda é de Katharine Hepburn que possui quatro carecas dourados em casa. O pior da festa foi não ter apresentado os concorrentes a Melhor Canção (categoria que promete ser reformulada no ano que vem). Dito isso vamos aos ganhadores e minhas devidas marcações (para acertos e * para os quase...)

Filme: O ARTISTA☻ 
Diretor: Michel Hazanavicius/O ARTISTA 
Ator: Jean Dujardin (O Artista) *(será que terá a sorte de Marion Cotillard?)
Atriz: Meryl Streep/ A DAMA DE FERRO* (Foi Bacana ver Streep ganhar, até Viola Davis gostou!)
Atriz Coadjuvante: Octavia Spencer/ HISTÓRIAS CRUZADAS
Ator Coadjuvante: Christopher Plummer /TODA FORMA DE AMOR
Animação: RANGO
Filme Estrangeiro: A SEPARAÇÃO
Roteiro Original: MEIA NOITE EM PARIS
Roteiro Adaptado: OS DESCENDENTES
Figurino: O ARTISTA
Fotografia: A INVENÇÃO DE HUGO CABRET (A Árvore da Vida merecia pelo menos essa)
Montagem: MILLENIUM - OS HOMENS QUE NÃO AMAVAM AS MULHERES (surpresaaaa!)
Direção de Arte: A INVENÇÃO DE HUGO CABRET
Maquiagem: A DAMA DE FERRO
Efeitos Visuais: A INVENÇÃO DE HUGO CABRET
Trilha Sonora: O ARTISTA 
Canção Original: "Man or Muppet"/ OS MUPPETS(mas foi a categoria mais micada da noite)
Mixagem de som: A INVENÇÃO DE HUGO CABRET 
Edição de Som: A INVENÇÃO DE HUGO CABRET
Documentário: UNDERFEATED (sucesso atualmente nos EUA, derrotou o documentário sobre balé feito 3D que era o favorito)
Curta Documentário: SAVING FACE * (eu achei esse o mais interessante, mas o outro tinha Elvis no título, rs)
Curta de Animação: THE FANTASTIC FLYING BOOKS OF MR. MORRIS LESSMORE(com um título desses tinha como perder?)
Curta Metragem:THE SHORE (um curta sobre nostalgia no ano mais nostálgico do Oscar)

Hummm.... uma pequena melhora com relação ao ano passado: 17 acertos de 24 palpites! Ano passado só acertei 14... se eu privilegiasse três dos meus palpites secundários nas categorias de ator, atriz e curta documentário eu teria 20 acertos! Nada mal, prometo que ano que vem eu melhoro!

sábado, 25 de fevereiro de 2012

APOSTAS PARA O OSCAR 2012

Billy Cristal: a justiça no Oscar é cega?

No blog da Ana Maria Bahiana  ela divulgou parte da detalhada matéria do Los Angeles Times que mostra como se constitui o corpo votante do Oscar. Trata-se de seis mil pessoas que correspondem às seguintes características: 77 % são homens, 94% são brancos, 64% jamais foram indicados aos prêmios que escolhem, 42% tiveram seu último projeto em 2010 e 79% tem mais de  50 anos. Junte a isso o fato de que em 83 anos de Oscar somente 4% dos prêmios foram para não-brancos, que Hale Berry (A Última Ceia/2001) foi a única negra a receber  Oscar de atriz, Kathryn Bigelow (Guerra ao Terror/2008) foi a única mulher a ganhar o Oscar de direção. Dos 43 membros da diretoria da Academia, seis são mulheres e apenas uma pessoa é negra. Agora, tente imaginar como todos eles pensam cinematograficamente e arrisque seus palpites para os premiados de amanhã. Nesse ano resolvi fazer diferente e apostar em quem vai ganhar e quem é sua maior ameaça, meus palpites ficaram assim:

Filme: O ARTISTA
(maior ameaça: A Invenção de Hugo Cabret)
Diretor: Michel Hazanavicius/O ARTISTA 
(maior ameaça: Martin Scorsese/A Invenção de Hugo Cabret)
Ator: George Clooney/OS DESCENDENTES 
(maior ameaça: Jean Dujardin/O Artista)
Atriz: Viola Davis / HISTÓRIAS CRUZADAS
(maior ameaça: Meryl Streep/ A Dama de Ferro)
Atriz Coadjuvante: Octavia Spencer/ HISTÓRIAS CRUZADAS
(maior ameaça: Jessica Chastain/ Histórias Cruzadas)
Ator Coadjuvante: Christopher Plummer /TODA FORMA DE AMOR
(maior ameaça: NINGUÉM)
Animação: RANGO
(maior ameaça: Um Gato em Paris)
Filme Estrangeiro: A SEPARAÇÃO
(maior ameaça: In Darkness)
Roteiro Original: MEIA NOITE EM PARIS
(maior ameaça: O Artista)
Roteiro Adaptado: OS DESCENDENTES
(maior ameaça: A Invenção de Hugo Cabret)
Figurino: O ARTISTA
(maior ameaça: Anonimo)
Fotografia: A ÁRVORE DA VIDA
(maior ameaça: O Artista)
Montagem: A INVENÇÃO DE HUGO CABRET
(maior ameaça: O Artista)
Direção de Arte: A INVENÇÃO DE HUGO CABRET
(maior ameaça: O Artista)
Maquiagem: A DAMA DE FERRO
(maior ameaça: Harry Potter e as Relíquias da Morte - Parte 2)
Efeitos Visuais: A INVENÇÃO DE HUGO CABRET
(maior ameaça: O Planeta dos Macacos - A Origem)
Trilha Sonora: O ARTISTA
(maior ameaça: A Invenção de Hugo Cabret)
Canção Original: "Man or Muppet"/ OS MUPPETS
(maior ameaça: só resta mesmo "Real in Rio"/ Rio)
Mixagem de som: A INVENÇÃO DE HUGO CABRET
(maior ameaça: Cavalo de Guerra)
Edição de Som: A INVENÇÃO DE HUGO CABRET
(maior ameaça: Drive)
Documentário: PINA
(maior ameça: Paradise Lost 3 - Purgatory)
Curta Documentário: GOD IS THE BIGGER ELVIS
(maior ameaça: Saving Face)
Curta de Animação: THE FANTASTIC FLYING BOOKS OF MR. MORRIS LESSMORE
(maior ameaça: La Luna)
Curta Metragem: PENTECOST
(maior ameaça: Time Freak)

Só para lembar o Oscar deste ano volta a ser apresentado por Billy Cristal - o que já é uma ótima notícia para fazer esquecer os apresentadores pífios do ano passado. E você, quem acha que vai levar o careca dourado para a casa?

INDICADOS AO OSCAR 2012: MELHOR FILME

Eu não escrevi introduções para as outras categorias, mas você já percebeu que os atores dos filmes indicados ao Oscar acabaram se repetindo? Viola Davis (Tão Forte Tão Perto / Histórias Cruzadas), Tom Riddleston (Cavalo de Guerra / Meia Noite em Paris), Brad Pitt (A Árvore da Vida / O Homem que Mudou o Jogo) e Jessica Chastain (A Árvore da Vida / Histórias Cruzadas) aparecem em dois filmes da lista dos concorrentes. O mesmo poderia ter acontecido com George Clooney e Phillip Seymour Hoffman... mas deixa isso pra lá, vamos aos indicados ao maior prêmio da noite de amanhã:

Depois de levar a Palma de Ouro em Cannes deste ano, o novo filme de Terrence Mallick conseguiu ficar na lista dos melhores do ano para a Academia. O filme que beira o experimental - com a narrativa baseada nas memórias de uma família da década de 1950 - capricha na fotografia, na trilha sonora e nas atuações do seu elenco encabeçado por Brad Pitt e Jessica Chastain (ele no papel do pai rigoroso e ela como a mãe carinhosa - o embate entre essas dois caminhos é vivido internamente pelo filho mais velho - interpretado na idade adulta por Sean Penn). Ambientar uma história dessas em analogias entre a gênese e o apocalipse demorou mais cinco anos na vida de Mallick e conquistou as indicações de Filme, direção (Terrence Mallick) e fotografia. 

O campeão das indicações deste ano (concorre em onze: filme, direção/Martin Scorsese, roteiro adaptado, figurino, fotografia, montagem, direção de arte, efeitos visuais, trilha sonora, mixagem de som e edição de som) é a primeira aventura de Scorsese pelo universo infantil. Adaptado do livro de Brian Selznick o filme conta a história de um órfão que encontra um dos pioneiros do cinema: Georges Méliés. O fato de utilizar a tecnologia 3D para realizar uma ode à história do cinema  pode contar pontos entre os votantes da Academia neste ano em que a nostalgia tomou conta dos concorrentes. O problema do filme é o preconceito que a Academia tem com os longas que investem na fantasia.

Steven Spielberg realizou um filme com toda a pompa para o Oscar. Basta ver o trailer para vermos como o filme tem aquele jeitão dos longas que a Academia adora premiar. O romance de Michael Morpurgo virou peça de sucesso e chegou aos cinemas contando a história do cavalo Joey durante a primeira guerra mundial e a busca de seu dono para reencontrá-lo. Embora tenha atuações marcantes de Tom Hiddleston e Emily Watson, a ausência de Spielberg entre os indicados ao prêmio de direção já aponta que o longa tem poucas chances. Mesmo com muita gente o considerando antiquado conseguiu outras cinco indicações em categorias técnicas: fotografia, direção de arte, trilha sonora, mixagem de som e edição de som.  

Um dos poucos sucessos de bilheteria entre os indicados, The Help foi lançado em meados de 2011 e provou ter fôlego para chegar às premiações. Apesar de Tate Taylor não ter conseguido sua indicação ao prêmio de direção o filme conta com atuações inspiradas de um elenco feminino exemplar (que ganhou o prêmio do sindicato deste ano)! Ambientado no sul dos EUA na década de 1960, o filme conta a história de empregadas negras que resolvem participar das entrevistas para um livro onde a relação com as patroas é exposta. Tendo como fundo a luta pelos direitos civis e o racismo o filme conquistou o público e a Academia que lhe rendeu 4 indicações (filme, atriz coadjuvante/Jessica Chastain sendo o favorito nas categorias atriz/Viola Davis, atriz coadjuvante/Octavia Spencer)

Stephen Daldry conseguiu colocar mais um filme entre os finalistas do Oscar, embora muitos o considerem o pior de sua obra. Baseado no livro de Johnatan Safron Foer (o mesmo de Uma Vida Iluminada/2005) a trama conta a busca de um menino com síndrome de Asperge que teve o pai morto nos atentados de onze de setembro. O pai deixou uma chave misteriosa para o menino que irá encontrar vários personagens interessantes pelo caminho e que o ajudarão a digerir o seu trauma. Apesar de ser menos profundo do que deveria o filme conseguiu duas indicações ao careca dourado: filme e ator coadjuvante/Max Von Sydow. Mesmo tendo no elenco Tom Hanks e Sandra Bullock o público não se empolgou. 
  
Sucesso desde que abriu o Festival de Cannes de 2011, Meia Noite em Paris foi o longa que fez as pazes de Woody Allen com o grande público e com a Academia. O filme conta a história de um escritor (Owen Wilson) em crise que em uma viagem à Paris consegue voltar no tempo sempre que o relógio anuncia a meia-noite. Basta isso acontecer para que seja transportado para a Paris dos anos 1920 onde encontra pessoas famosas como F. Scott Fitzgerald (Tom Riddleston) e Salvador Dalí (Adrien Brody). Indicado aos prêmios de filme, direção, direção de arte, mas é o favorito somente na categoria de roteiro original.  

O Artista (The Artist)
Três filmes que deram o que falar em Cannes chegaram aos finalistas do Oscar, mas O Artista foi o que mais me surpreendeu por se tratar de uma co-produção francesa e americana, em preto e branco e que reproduz um filme mudo. Contando a história de um astro (Jean Dujardin) que está em crise com a chegada do cinema falado e sua relação com uma atriz em ascensão (Berenice Bejo) o filme caiu na graça da Academia que corre sério risco de o considerar o melhor do ano passado. Embora o sucesso do filme seja modesto perante o público, a trama investe no tom de comédia romântica e pode premiar até seu diretor e ator. O filme concorre em 10 categorias: filme, direção/Michel Hazanavicius, ator/Jean Dujardin, atriz coadjuvante/Berenice Bejo, roteiro original, figurino, fotografia, montagem, direção de arte e trilha sonora).

O Homem que Mudou o Jogo (Moneyball)
O filme de Bennet Miller (Capote/2005) mostra a história real de Billy Beane (Brad Pitt) um homem que reinventa a forma de escalar um time de baseball com a ajuda de um nerd (Jonah Hill) que não manja nada do esporte, mas entende tudo de computadores. Com base na experiência, a dupla consegue escalar um time eficiente, mesmo sem ter muito dinheiro. O filme tem aquele jeito de filme esportivo que o público americano adora e concorre nas categorias de filme, ator coadjuvante/Jonah Hill, roteiro adaptado e montagem, mas tem chances somente na categoria ator (a qual Pitt irá enfrentar mais uma vez Jean Dujardin) e o amigo George Clooney.

O novo longa de Alexander Payne foi o favorito ao Oscar até pouco depois do Globo de Ouro, onde saiu premiado na categoria de Filme Dramático. O problema foi que O Artista ganhou mais fôlego ao receber o prêmio de melhor Comédia/Musical do ano e com a premiação de Jean Dujardin no prêmio do sindicato. Os Descendentes equilibra drama e comédia ao contar a história de um pai (George Clooney) que precisa aprender a lidar com as filhas na ausência da esposa que está em coma no hospital. Mais uma vez o diretor explora personagens que precisam amadurecer na marra! Embora não seja mais o favorito o filme ainda tem chances - e concorre ainda nas categorias direção/Alexander Payne, ator/George Clooney, roteiro adaptado e montagem. 

Se a Academia continuasse elegendo dez candidatos por ano, provavelmente o posto teria ficado com o quarto filme do cineasta George Clooney. A trama do rapaz idealista que descobre as maracutaias do político para o qual trabalha conseguiu somente uma indicação ao prêmio de roteiro adaptado. De nada adiantou o sucesso perante público e crítica num filme sobre a forma como a política intoxica. Existe uma explicação para isso, ou melhor duas! Uma é o período eleitoreiro que os EUA atravessa (e a Academia odeia polêmicas assim, lembra em 2005 o que houve com Fahrenheit 11/9) e a outra foi a chacota que o elenco renomado do filme fez sobre concorrer ao Oscar numa das coletivas do Festival de Toronto. Mas com as chances que tem de levar o Oscar de ator para casa, George Clooney não deve estar magoado.

DVD: Contra o Tempo

Contra o Tempo: O Dia da Marmota Hardcore! 

Duncan Jones já pode celebrar por não ser conhecido como o filho de David Bowie. Depois da promissora estreia como cineasta no ótimo Lunar (2009), Duncan se aventura mais uma vez pelo universo da ficção científica com este Contra o Tempo. Apesar de ser um filme de estúdio, com um casal de atores badalados com indicações ao Oscar no currículo (Jake Gyllenhaal e Vera Farmiga), o interesse do diretor parece ser o mesmo: o que sobra de humanidade perante as experiências científicas. Misture no roteiro dilemas éticos da ciência, uma crise de identidade no meio do caminho e a possibilidade de mudar a sua história e verá que existe muito em comum entre os dois filmes do herdeiro de Ziggy Stardust - mesmo que a trama de ambos seja totalmente diferente. Contra o Tempo  deixa claro que começa pelo meio do caminho, um homem desperta em um trem com a cara de que não faz a mínima ideia do que está acontecendo (e os traços de Jake Gyllenhaal parecem ser feitos para isso), conversa com uma desconhecida (a eficiente Michelle Monaghan) que insiste em chamá-lo por outro nome, enquanto isso um sujeito encrenca com outro, cai um pouco de café em seu sapato, um rapaz corre atrás de outro que esqueceu a carteira no vagão e tudo explode pouco depois. Esta rotina de oito minutos irá se  repetir durante todo o filme enquanto, assim como o protagonista, tentamos entender o que está acontecendo. Descobrimos que ele se chama Colter Stevens, servia no meio da Guerra no Oriente Médio e agora faz parte de uma experiência onde o tempo faz toda a diferença. No experimento construído por Doutor Rutledge (Jeffrey Wright) ele é capaz de se conectar com um passageiro de um trem que explodiu naquela manhã e - se tudo der certo - descobrir quem é o terrorista responsável pelo atentado. Duncan Jones brinca com as referências de seu protagonista, faz com que interaja com os outros passageiros dentro de uma rotina pré-estabelecida, busca suspeitos em potencial com toda a angústia possível para os oito minutos da missão e esbarra na expectativa de poder mudar o futuro.    Neste ponto o filme se torna mais dramático ao percebermos que o universo ao qual Colter interage é um mundo paralelo (o Código Fonte do título em inglês) e não importa quantas vezes ele procure alterar os fatos, o passado já aconteceu. O roteiro é esperto em saber que não importe quantos truques  narrativos utilize, o filme não poderia se ancorar somente neles e insere questionamentos sobre a ética do projeto (afinal de contas o que houve com Colter? Ele está vivo ou morto? Por ser parte da experiência ele não pode ter vontade própria?) e neste ponto conta com o apoio da militar Coleen Goldwin (Vera Farmiga), que mesmo diante da importância do projeto não perde a noção de que está lidando com um ser humano em meio àquela confusão. Misturando referências que vão de Bill Murray preso no dia da marmota na comédia Feitiço do Tempo (1993), passando pelo alemão Corra, Lola, Corra (1998) até o filme de ação Déjà Vu (2006), Contra o Tempo é um filme eficiente para quem busca entretenimento original e bem elaborado, mas nada disso garantiu que fosse um sucesso de bilheteria no verão americano (no Brasil sua estreia foi adiada inúmeras vezes e a bilheteria foi modesta - mas a arrecadação mundial foi quatro vezes maior que seu custo). No entanto, o filme merece ser conferido nem que seja pelo seu final enigmático. 

Contra o Tempo (Source Code/EUA-França-2010) de Duncan Jones com Jake Gyllenhaal, Vera Farmiga, Jeffrey Wright, Michelle Monaghan e Michael Arden. ☻☻

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

FILMED+: Noivo Neurótico, Noiva Nervosa

Annie e Alvy: um dos melhores casais de todos os tempos.

Acho que o filme mais celebrado de Woody Allen é Annie Hall (que aqui no Brasil recebeu o nome meio abobado de Noivo Neurótico, Noiva Nervosa - o que é uma grande maldade, já que o personagem de Allen pode até ser neurótico, mas a noiva Annie Hall feita por Diane Keaton está longe de ser nervosa). Ganhador dos Oscars de Filme, direção, atriz e roteiro original, o filme é cultuado até hoje como uma das melhores comédias românticas de todos os tempos, sem dúvida o mérito está no tom moderno que Woody Allen utiliza para contar uma história de amor como tantas outras, inserindo elementos que beiram o surreal - isso em 1977. Logo de início quando o comediante Alvy Singer (Woody Allen) nos apresenta a sua infância (com a casa construída embaixo de uma montanha russa) vemos que o filme, apesar de realista, tem um pezinho no mundo muito próprio de seu autor. Singer é um ator que vive de seus espetáculos stand up - pois é, lamento informar, esse tipo de humor não é novidade. Mesmo com toda a pompa típica do personagem criado de Allen para si, ele não tem problema em conquistar a mulherada com suas piadinhas intelectualizadas e suas neuroses (entre suas conquistas está Shelley Duvall que ficou famosa fazendo a Olívia Palito do filme Popeye/1980 de Robert Altman e mais ainda como a esposa perseguida de O Iluminado/1980). O mundo de Alvy começa a ter mais graça quando ele conhece a cantora Annie Hall (Diane Keaton), com quem viverá uma história de amor onde as diferenças e brincadeirinhas do casal rendem momentos bem divertidos - estes momentos vão desde o desastrado preparo de lagostas até a antológica cena em que Annie observa-se na cama com Alvy (e este percebe que ela está "desconectada").  As diferenças do casal servem para pontuar uma série de aspectos muito comuns aos relacionamentos da década de 1970 (o ciúme em meio ao sexo livre, o uso de drogas, as referências psicanalíticas que estavam no auge...), mas o maior achado do filme são os elementos narrativos bastante originais utilizados por Allen para contar este relacionamento conforme enfrenta sua crise conjugal - existem momentos em que o casal visita o passado de um deles com a intenção de refletir sobre a relevância daquele momento, falas destinadas ao espectador (especialmente quando o casal se aventura a ir ao cinema) e a postura descolada dos protagonistas que tem toda a relação com a cidade que está a sua volta: Nova York. Basta dizer que precisa sair da cidade para ver Alvy entrar em crise - como se reconhecesse que aquele é o seu habitat natural e fora dali suas referências não funcionam.  Além de bem escrito e moderninho, o filme não esconde o fato de ser uma declaração de amor para Diane Keaton - com quem Allen namorou por um tempo. A personagem Annie Hall foi totalmente inspirada na atriz, que a completou criando um tipo bastante feminino vestindo roupas masculinizadas - o que se tornou uma inspiração para um bando de mulheres quando o filme foi lançado. A semelhança de Diane com Annie chegou a criar polêmica quando recebeu o Oscar de melhor atriz (afinal, ela estava interpretando a si mesma?), mas sua capacidade de borrar as  fronteiras da ficção e da realidade de forma tão adorável merecia mesmo um prêmio (e o fato de Allen sempre zelar pelo improviso ajuda muito). Diane está apaixonante no filme e podemos sentir os mesmos sentimentos de Alvyn quando o filme chega ao fim. A ausência de sua amada merecia mesmo um exorcismo bem humorado como este filme. 

Noivo Neurótico, Noiva Nervosa (Annie Hall/EUA-1977) de Woody Allen com Woody Allen, Diane Keaton, Paul Simon e Christopher Walken. ☻☻☻☻

CATÁLOGO: O Sonho de Cassandra

McGregor e Farrell: boas atuações em drama de Woody Allen. 

Faz tempo que Woody Allen deixou de fazer filmes somente em Nova York, com Match Point (2005) o diretor migrou para a Europa em busca de novos ares - com o pretexto de ser mais barato filmar por lá do que nos EUA. Embora seja conhecido por suas comédias, Match Point era mais um drama de suspense do que qualquer outra coisa (o que marcava o retorno do diretor aos temas mais sérios). Depois Allen voltou à comédia despretensiosa (com Scoop/2006) e diante da recepção fria da crítica e do público lançou este O Sonho de Cassandra, novamente inglês e com nomes europeus no elenco, mas seu maior pecado foi repetir a estrutura de seu sucesso de 2005. O Sonho de Cassandra já anuncia em seu título que não é um filme leve (eu já comentei aqui antes sobre o mito grego de Cassandra que estava condenada a sonhar com o futuro e viver a agonia de não conseguir alterar os acontecimentos porque ninguém acreditava nela), mas o nome remete somente ao barco comprado por dois irmãos, mesmo assim, existe um bocado de tragédia no texto de Woody. Ian (Ewan McGregor) e Terry (Colin Farrell) são dois irmãos em situações de vida bem diferentes: enquanto o primeiro almeja ser mais bem sucedido do que lhe permite administrar o restaurante do pai, o segundo trabalha como mecânico enquanto tenta vencer o vício por jogatinas. Ian é um mulherengo que pede emprestado os carrões da oficina do irmão para conquistar a mulherada - dizendo ser empresário do ramo hoteleiro na Califórnia (um sonho luminoso numa cinzenta Inglaterra). Terry se contenta com a namorada apaixonada, Kate (Sally Hawkins), e brincar com a sorte em jogo de cartas. A apresentação dos personagens é sem pressa até o momento que Ian conhece a atriz Angela (Hayley Atwell vista recentemente em Capitão América e que aqui aparece totalmente diferente) e percebe que para ser feliz ao lado daquela garota precisa fazer muito dinheiro - enquanto Terry consegue uma dívida alta com agiotas.  Até este ponto todo mundo fala muito sobre um tal tio rico chamado Howard (Tom Wilkinson em presença rápida e marcante), o qual imaginamos que os dois irão pedir dinheiro para dar um jeito em suas vidas. O problema é que o tio quer algo em troca, no caso, matar um ex-funcionário que poderá levá-lo para a prisão se fizer algumas declarações. Ian e Terry então se veem num dilema: fazer o serviço ou não? Ironicamente os personagens até mencionam um sonho aqui e outro ali que nunca são detalhados, mas não precisa ser nenhuma Cassandra da mitologia para saber que as coisas não vão acabar bem se resolverem ajudar o tal tio (e o roteiro brinca com isso o tempo todo dizendo que estarão "ultrapassando os limites"). A melhor parte do filme se concentra nos conflitos entre os dois irmãos vivido por gosto por McGregor e Farrell. Não é difícil perceber quem tem a frieza ambiciosa necessária para motivar o possível serviço e quem tem a mente preparada para  elaborar os detalhes da situação.  Todo mundo sabe que mesmo quando não é genial, um filme de Woody Allen é melhor do que a média, até porque ele é um ótimo roteirista - fique atento aos personagens que nunca estão ali por acaso (é o caso de da risonha Kate que terá papel fundamental no desfecho da história) e existem reviravoltas que nunca parecem forçadas ou sem razão. No entanto, o problema aqui está no desfecho. É inevitável perceber a relação da solução encontrada pelo diretor com a do semelhante Match Point, só que com a desvantagem da última cena ser bem menos interessante do que a conversa policial do filme de 2005. No fim das contas, a impressão é que O Sonho de Cassandra é um genérico de MP, só que sem o frescor da novidade - e por isso, alguns fãs podem considerá-lo decepcionante.

O Sonho de Cassandra (Cassandra's Dream/EUA-Reino Unido-França-2007) de Woody Allen com Ewan McGregor, Colin Farrell, Tom Wilkinson e Sally Hawkins. ☻☻

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

CATÁLOGO: Os Infiltrados

Leo e Jack: o mocinho e o malvadão.

Não há dúvida de que o currículo de Martin Scorsese merecia um Oscar há muito tempo. Diretor de clássicos como Touro Indomável (1980), Os Bons Companheiros (1990) e (o meu favorito) Taxi Driver (1976), o diretor só foi reconhecido pela Academia em 2007 por Os Infiltrados. Muitos fãs já estavam com aquela sensação desconfortável de que um dos mestres da sétima arte receberia um desses Oscars pelo conjunto da obra, que parece menos uma homenagem e mais um pedido de desculpas (me desculpem fãs, mas é isso que irá acontecer com Glenn Close). Antes de Os Infiltrados, Scorsese andava se esforçando para agradar a Academia - fez Gangues de Nova York (2002) e O Aviador (2004) com toda a pompa que costuma agradar ao tio Oscar, mas só vieram indicações. O filme que lhe rendeu o Oscar de direção marcou o seu retorno ao cinema nervoso de outrora, mas está longe de ter a genialidade dos seus maiores clássicos. Para começar é um raro caso de filme refilmado que ganhou o prêmio de Melhor Filme, afinal trata-se da versão americana para o coreano Conflitos Internos (2002) que usava a interessante premissa de contar a história de um bandido infiltrado num grupo de policiais e um policial infiltrado no meio de bandidos. Pode ser um preconceito idiota de minha parte, mas acho estranho considerar o melhor filme de 2006 uma refilmagem. Enfim, vamos ao filme. Leonardo DiCaprio (em sua terceira parceria com o diretor) é Billy, um policial que investiu anos de sua vida na missão de construir um histórico capaz de ser digno de participar do grupo do sanguinário gangster Frank Costello (Jack Nicholson). Ironicamente, os gangsters também construíram um rapaz capaz de galgar os postos mais altos entre os investigadores da polícia, trata-se de Collin Sullivan (Matt Damon) que tem a função de estragar qualquer ameaça policial aos negócios de Costello. As histórias de Collin e Billy são contadas paralelamente até se cruzarem, não só por conta dos lados opostos que estão, mas também pela atração de Billy por Madolyn (Vera Farmiga, indicada ao Globo de Ouro de coadjuvante e sendo percebida em Hollywood). Além de tratar de  personagens infiltrados em ambos os lados, Scorsese borra as diferenças entre polícia e bandido (e chega ao extremo de revelar aos poucos que havia outros infiltrados durante todo o filme). A direção é tensa e existem cenas de ação de tirar o fôlego - e com trilha sonora de primeira. Tiros, sangue e muita testosterona ajudaram a chamar a atenção para um filme que tenta manter o equilíbrio para não cair no exagero - e nessas horas o humor aparece em momentos inusitados. O elenco ainda conta com Alec Baldwin, Martin Sheen, Ray Winstone e Mark Wahlberg que acabou rindo por último ao ser o único lembrado entre os indicados ao Oscar. No meio de tantos policiais bandidos e bandidos policiais, Wahlberg mantém a carranca incorruptível por toda a sessão - mesmo quando os protagonistas parecem ser dizimados impiedosamente. O sucesso de público e crítica - além dos quatro Oscars que recebeu: filme, direção, roteiro adaptado e edição chegou a gerar boatos sobre uma continuação, mas que não se concretizou. Apesar de tanta celebração o filme não está entre os meus favoritos com a assinatura de Scorsese, por vezes me parece longo e confuso, mas ainda assim é um dos melhores policiais na década passada. 

Os Infiltrados (The Departed/EUA-2006) de Martin Scorsese com Leonardo DiCaprio, Matt Damon, Jack Nicholson, Vera Farmiga e Alex Baldwin. ☻☻☻

CATÁLOGO: Sideways

Oh, Church, Madsen e Giamatti: explorando a vida numa garrafa de vinho.

Se você é um dos que torcem para que Os Descendentes leve para a casa a estatueta de melhor filme no Oscar deste domingo, você não pode deixar de ver Sideways - Entre Umas e Outras, filme lançado em 2004 pelo diretor Alexander Payne, que no hiato de sete anos provou que não perdeu a mão para misturar comédia e drama ancorado nas atuações de seu elenco. Sideways levou o Globo de Ouro de Melhor Comédia (ainda concorria a diretor, ator de comédia, roteiro, ator coadjuvante e atriz coadjuvante) e ganhou fôlego para chegar ao Oscar nas categorias principais (filme, direção, ator coadjuvante/Thomas Haden Church, atriz coadjuvante/Virginia Madsen, mas levou somente o de roteiro adaptado). Em toda a sua filmografia, Payne tentava indicar que em meio aos defeitos de seus personagens, nós poderíamos nos identificar com eles, mas é em Sideways que esta ambição chega ao seu auge. A trama é simples, mas belamente escrita ao acompanhar dois amigos que se conhecem desde o colegial. Paul Miles  (Paul Giamatti) é um professor que pretende largar a profissão e investir na carreira de escritor, além disso é apaixonado por vinhos e pretende despertar em Jack (Church) essa mesma paixão. Jack está prestes a se casar (Church) e é convidado por Miles a fazer uma viagem pelas vinículas dos Estados Unidos - mas Jack (um ator que teve algum sucesso e agora ganha dinheiro anunciando produtos na TV) está mais interessado em encher a cara e transar com algumas mulheres pelo caminho em uma viagem de despedida de solteiro. Dá para perceber que as diferenças entre os dois amigos irá render situações interessantes, mas para enriquecer a sua narrativa, Payne insere duas garçonetes na trama: Maya (Madsen) e Stephanie (Sandra Oh, casada com o diretor na época). Maya é conhecida de Miles há tempos, mas ele é incapaz de se declarar para ela - e quando o faz é por meio de uma metáfora sobre a uva pinot noir (de difícil cultivo e deliciosa apreciação), declaração a qual ela retribui divagando sobre a vida que existe dentro de uma garrafa de vinho (afinal, dependendo do dia em que for aberta o sabor é totalmente diferente devido a fermentação). Enquanto Maya e Miles buscam um relacionamento que evolui calmamente para um romance, Jack e Stephanie são mais... carnais. Mesmo complexificando personagens aparentemente simples, Payne consegue alinhavar as ótimas atuações do elenco com maestria (eu destaco o olhar apaixonado de Virginia Madsen para Paul Giamatti, Katherine Heigl que vive fazendo comédias românticas hediondas deveria aprender com ela) e proporciona analogias sobre vinhos que não parecem bobas ou pedantes (especialmente quando Miles está em frangalhos e entorna um balde de vinho garganta abaixo). Ao explorar a vida sem rumo de dois personagens que poderiam ser considerados autênticos losers americanos, o diretor os transforma em pessoas de carne e osso com suas angústias e frustrações - que misturam drama, romance e comédia na busca por um rumo na vida. A bela fotografia e um final que parece voltar a mesma situação do início (só que num contexto totalmente diferente) conferem ainda mais charme a este filme.  A premissa de dois amigos que saem para beber vinho numa espécie de despedida de solteiro você já deve ter visto um zilhão de vezes, mas nenhuma delas segue os rumos deste aqui, ao dar novas cores a esta premissa,  muitos consideram esta a obra-prima do diretor. 

Sideways - Entre Umas e Outras (Sideways/EUA-2004) de Alexander Payne com Paul Giamatti, Thomas Haden Church, Virginia Madsen e Sandra Oh. ☻☻☻☻

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

INDICADOS AO OSCAR: DIRETOR


Alexander Payne (Os Descendentes)
Desde a sua estreia na direção com Ruth em Questão (1996) este diretor americano de origem grega (seu sobrenome real é Papadopoulos) busca o equilíbrio perfeito entre drama e comédia. Se no início da carreira a balança sempre tendia para a comédia (Ruth e Eleição/1999) depois de As Confissões de Schmidt/2002 pende mais para o drama. Em Os Descendentes ele aborda a relação de um homem com suas duas filhas e revelações sobre a esposa em coma num hospital. Esse período em que os papéis da família precisam se reorganizar é o foco do filme. A direção de Payne é elogiada pela simplicidade e lhe rendeu indicações em todos os prêmios do ano. Desde Sideways/2006 (que lhe rendeu o primeiro Oscar da carreira na categoria roteiro adaptado) que Payne não dirigia um longa-metragem. Esta é a segunda indicação de Payne ao Oscar da categoria (concorreu antes por Sideways)   


Martin Scorsese (A Invenção de Hugo Cabret)
Faz tempo que Scorsese deixou de ser um diretor e se tornou um ícone da sétima arte. Entre os cineastas celebrados na década de 1970 é o que apresenta mais vitalidade e capacidade de transformar seu cinema em obras surpreendentes. Afinal, quem diria que o diretor dos violentos Taxi Driver/1976, Os Bons Companheiros/1990 e Cassino/1995 iria fazer um aclamado filme infantil em 3D a pedido de sua filha? Hugo Cabret foi o recordista de indicações deste ano (11) após lhe render o Globo de Ouro de melhor diretor neste ano. Apesar dos anos de serviço prestados ao cinema, Scorsese tem apenas um Oscar de direção no currículo (por Os Infiltrados/2004) quando já contabilizava outras cinco indicações ao prêmio de direção da Academia (Touro Indomável/1980, A Última Tentação de Cristo/1988, Os Bons Companheiros/1991, Gangues de Nova York/2002 e Aviador/2004).   

Michel Hazanavicius (O Artista)
Estreante nas indicações ao Oscar, Michel (esq.) tem outros quatro filmes no currículo - e o mais famoso deles, Agente 117, estrelado pelo mesmo Jean Dujardin de O Artista. Faz tempo que o diretor indica que no seu cinema existe boa dose de nostalgia, mas no celebrado O Artista ele se superou: um filme mudo e em preto e branco sobre a transição do cinema mudo para  cinema falado. A trajetória de George Valentin na Hollywood de 1927 remete diretamente à história do cinema e em tempos de assombros tecnológicos ressalta que o principal combustível da sétima arte é a emoção. De bilheteria modesta nos Estados Unidos e só recentemente comprado para ser exibido no Brasil, O Artista tem sido multipremiado (apesar de ter perdido a Palma de Ouro em Cannes para A Árvore da Vida. Hazanavicius tem fortes chances de sair premiado pela Academia (e o fato do filme ter sido rodado em Hollywood ajuda bastante).  

Terrence Malick (A Árvore da  Vida
Malick sempre gostou de narrativas diferentes, meio desconectadas com cenas carregadas de paisagens naturais e narrativas em off, isso faz com que seja cultuado por uns e criticado por outros - mas, ao que tudo indica, a Academia aprecia seu trabalho. Entre os indicados é Mallick que apresenta a maior ousadia numa obra que beira o experimental numa trama simples baseada nas memórias de uma família da década de 1950. Misturando cenas deslumbrantes, boas atuações e muitas filosofices sobre a família, morte e divindade, o recluso Mallick conseguiu sua segunda indicação ao Oscar de direção (a primeira foi por Além da Linha Vermelha/1998). Apesar de estar na ativa desde a década de 1960, Mallick dirigiu apenas cinco longas - e a aclamação por Árvore da Vida serviu para espantar os maus presságios sobre sua carreira depois das críticas a O Novo Mundo (2005). 

Woody Allen (Meia Noite em Paris)
O cultuado diretor nova-iorquinho é um dos recordistas de indicações da Academia (são 23 no total entre as categorias de ator, produtor, diretor e roteirista). Allen conseguiu sua maior bilheteria com a história do escritor que em uma viagem à Paris consegue viajar no tempo sempre que o relógio marca meia-noite. Nessas viagens ele encontra artistas que fizeram da cidade um pólo cultural de Ernest Hemingway, passando por Salvador Dalí e F.Scott Fitzgerald, Allen revisita o passado para falar sobre o presente. O filme mais elogiado de Allen em muito tempo ainda rendeu uma indicação na categoria de melhor roteiro (e ainda acho que deu uma força à França que ainda aparece no Oscar com O Artista em várias categorias e com a animação Gato em Paris). Adepto do improviso por parte dos atores, Allen já tem três Oscars na estante (dois de roteirista e um de direção por Noivo Neurótico, Noiva Nervosa/1977) e outras seis indicações nesta categoria (Tiros na Broadway/1994, Crimes e Pecados/1989, Hannah e suas Irmãs/1986, Broadway Danny Rose/1984 e Interiores/1978). 

O ESQUECIDO: George Clooney (Tudo Pelo Poder)
Quase que George Clooney (na foto entre Evan Rachel Wood e Ryan Gosling) repete o feito de 2005 quando compareceu ao Oscar com dois filmes, um como ator e outro como diretor. Tudo Pelo Poder é uma trama sobre os bastidores da política onde um jovem idealista descobre que pelos ideais precisa (ou não?) fazer algumas trapaças pelo caminho. Tudo Pelo Poder foi elogiado, indicado ao Globo de Ouro, mostrou que George é mesmo um cineasta de mão cheia quando resolve ser engajado - mas acabou rendendo a Clooney somente uma indicação ao Oscar de roteiro adaptado. Mas ele não tem do que reclamar com Os Descendentes sendo um dos concorrentes mais fortes deste ano e lhe dando fortes chances de ser premiado como ator. 

sábado, 18 de fevereiro de 2012

DVD: Amor a Toda Prova

Carrel: aprendendo a ser um macho alfa.

Amor a Toda Prova começa com uma espécie de bomba arremessada. Vemos um casal aparentemente feliz, Cal e Emily Weaver num restaurante refinado e em dúvida com o menu, Emily diz que não sabe muito bem o que quer, até decidir-se: "Eu quero o divórcio". Deste ponto em diante, o mundo de Cal parece se desintegrar na expressão de Steve Carrell - e tudo piora quando descobre que a esposa  o traiu com um colega de trabalho. Emily até suspeita que está atravessando uma crise de meia idade (ela chegou até a assistir um dos filmes da saga Crepúsculo!!!), mas julga que isso seja um privilégio dos homens. Diante da postura da esposa, Cal que sempre possuiu uma postura correta, não sabe mais como agir, preferindo choramingar em bares até que chama a atenção de um bon vivant, Jacob Palmer (Ryan Gosling) que irá ensiná-lo como superar o divórcio - isso inclui aulas de como se vestir, conversar e ser o mais sedutor possível (o que beira o impossível). Cal não supera a ausência de Emily, assim como Jacob não para de pensar numa garota que resistiu aos seus encantos. Ela se chama Hannah (Emma Stone), está prestes a se formar em Direito e vive um romance insosso com um engravatado. Ah, eu já ia me esquecendo de outro casal da trama, Robbie (Jonah Bobo), filho de Cal e Emily, que está apaixonado pela babá (Robbie Weaver) - que nutre uma paixão platônica por Cal. A dupla de diretores Glenn Ficarra e John Requa são mais que chegados em comédias ácidas, mas depois da última empreitada (o problemático O Golpista do Ano/2010 com Jim Carrey) eles resolveram pegar leve nesta ciranda amorosa, mas demonstram pleno domínio de sua dezena de personagens em meio a encontros e desencontros românticos. O mais bacana é que o resultado consegue ser bastante original devido ao humor bem articulado e nada bobo das situações que aparecem na mistura azeitada desses tipos tão comuns nas comédias românticas. Ficarra e Requa apontam para várias ironias das relações amorosas atuais e brincam com várias questões de gênero. Com o divórcio é Cal que não consegue esquecer a esposa (sua primeira namorada e única mulher com quem fez sexo até a separação), ao mesmo tempo é ele que é abandonado pelo casal de amigos (que acham mais correto ficar do lado de Emily, ou seja, uma inversão completa do antigo preconceito contra as mulheres divorciadas). Além disso é interessante como na primeira noite de amor com Hannah, é Jacob que não para de tagarelar sobre sua vida. Misturando todos num caldeirão bem humorado (que ainda inclui uma professora ex-alcoolatra, um tipo muito bem desenvolvido por Marisa Tomei) Amor a Toda Prova mostra-se um filme esperto o suficiente para não perder a graça nem quando Cal passa a reprovar o comportamento de Jacob (que precisa aprender a ser cada vez mais Cal) por motivos... familiares. Com um elenco excepcional, o filme merecia mais atenção nas premiações. Julianne Moore está ótima (como sempre) na crise de meia idade de sua personagem, Carell mostra mais uma vez que consegue conjugar drama e comédia na mesma cena e Ryan Gosling surpreende fazendo humor (que aceitou fazer o filme porque o psicólogo sugeriu como parte de um tratamento contra a carga dramática de seus filmes anteriores; acabou indicado ao Globo de Ouro de Ator de Comédia/Musical). O melhor de tudo é que após o final embalado pelo som da banda The Midle East o sorriso de satisfação ainda fica em nosso rosto por muito tempo. 

Amor a Toda Prova (Crazy. Stupid. Love/EUA-2011) de Glenn Ficarra e John Requa com Steve Carrel, Julianne Moore, Ryan Gosling, Emma Stone, Marisa Tomei e Kevin Bacon. 

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

DVD: Ganhar ou Ganhar

Giamatti e Shaffer: boa química para superar tropeços. 

Houve quem achasse que Paul Giamatti poderia aparecer nas premiações deste ano por conta de sua atuação neste Ganhar ou Ganhar, mas após ver o filme percebemos que é um exagero. Não que sua atuação seja ruim, mas não é muito diferente dos outros tipos que encarnou em sua carreira. O filme de Thomas McCarthy vale especialmente pela flluência na narrativa e um elenco dedicado, mas sem grandes destaques. Ganhar ou Ganhar é um filme simples, mas que investe num dilema moral em acertado tom de dramédia. O que eu achei mais interessante é que a crise econômica do Tio Sam motiva o cinema a produzir filmes que mostram o esporte como redenção. Mas antes que pensem que a trama deste aqui seja edificante e cheia de mensagens bonitas é bom deixar claro que não é bem assim. Apesar de todas as boas intenções de sua trama, existe um bocado de ironia no filme, especialmente em sua cena inicial onde acompanhamos um homem correndo num bosque para depois vermos que o tal não é atlético, mas o rechonchudo advogado Mike Flaherty (Giamatti) que tem seu ganha pão defendendo pequenas causas para idosos. Mas o sustento não anda fácil, além de casado, Mike possui duas filhas (um bebê inclusive) e descobrimos que está com problemas de saúde devido a situação atual. Para piorar, seu passatempo como técnico de um grupo de garotos que praticam luta livre vai de mal a pior. Localizado na beira do abismo ele acaba se dedicando ao caso de Leo (o veterano Burt Young), um idoso que já demonstra sinais de senilidade e precisa de ajuda. Interessante como apesar de toda a postura correta de Mike, ele se interessa menos pelo idoso e mais pelo pagamento que receberá se ficar com a tutela do senhor - assegurando que cuidará dele em sua casa para a juíza do caso. Mas ao contrário do prometido em juízo, Mike deixa o idoso numa casa de repouso enquanto recebe os cheques de mil e quinhentos dólares por mês. Não se preocupe, eu não contei o filme, este é apenas o começo, já que o que interessa é a chegada de Kyle (Alex Shaffer) na trama. Kyle é neto de Leo e abandonado pela mãe, acaba sob responsabilidade da família de Mike - e para surpresa deste, demonstra ser um exímio lutador capaz de salvar o seu time de garotos. McCarthy comprova mais uma vez seu interesse pelo impacto da chegada de um personagem inusitado na vida de outros e o gosto pelo desenvolvimento de uma trama sem pressas, sem golpes baixos e com muita simpatia. Assim como em O Visitante (2007) comprova sua habilidade em tornar os personagens em gente de carne e osso, pessoas que podiam ser nossos vizinhos e seguir caminhos não muito éticos sem a intenção de prejudicar alguém. Se Paul Giamatti possui uma boa atuação, ele deve muito à sua química com o desconhecido Shaffer. De cabelos descoloridos, o moleque faz aquele tipo apático, mas que consegue explorar a instabilidade do personagem na medida certa (especialmente com a chegada da mãe vivida por Melanie Linskey). Mas a dupla garante momentos divertidos quando Kyle acaba ensinando ao seus técnicos como vencer uma luta. Apesar de ser recebido com elogio em Sundance, Ganhar ou Ganhar não consegue ser mais do que simpático. Tem personagens interessantes e um texto que faz Mike repensar o que é importante - o que é suficiente para recomendar o filme. O mais engraçado mesmo é ver que nem quando se trata de um lutador adolescente a vida é menos problemática nesse tipo de filme - e o final abrupto (o filme tem mesmo esse cacoete, abandona coadjuvantes pelo meio do caminho, explora pouco a relação de Kyle com a mãe, o julgamento perto do final...), mas deixa de ser curiosa a opção de mostrar o que Mike deve fazer para voltar ao caminho certo (alguém mais considerou o uso do amarelo como um sinal de alerta?).

Ganhar ou Ganhar (Win Win/EUA-2011) de Thomas McCarthy com Paul Giamatti, Amy Ryan, Alex Shaffer, Burt Young, Melanie Linskey, Bobby Cannavale e Jeffrey Tambor. 

DVD: Guerreiro


Hardy e Edgerton: ressentimentos familiares resolvidos no tatame.

Um dos maiores segredos do universo é o critério para o lançamento de um filme direto em DVD aqui no Brasil. Enquanto os estúdios colocam um monte de porcarias em cartaz todos os meses, filmes interessantes chegam às locadoras no mais completo anonimato. Alguns deles são até badalados em premiações como 50% e o ganhador do Oscar de 2010, Guerra ao Terror. Guerreiro não está indicado ao prêmio de melhor filme no Oscar desse ano, mas deixou cravada a indicação de Nick Nolte na categoria de ator coadjuvante (o filme que lhe rendeu uma indicação anterior ao prêmio, Temporada de Caça/1999 também chegou somente em  locadoras). O filme assinado por Gavin O'Connor (que até faz uma participação como ator no filme, fique atento a um comentarista careca e de óculos) explora os bastidores das lutas de MMA que se tornou uma febre nos EUA o misturando com doses cavalares de drama familiar. Joel Edgerton (o bom ator de Reino Animal/2010 que segundo uma amiga) é o professor  de física Brendan, que por problemas financeiros (acarretados pela cirurgia da filha pequena) retorna às suas origens de levar pancada no MMA. A esposa (Jennifer Morrison) é contra, mas diante da situação não lhe sobra muita escolha. Paralelo a isso conhecemos o enfezado Tommy Riordan (Tom Hardy), que reencontra o pai (Nolte) depois de tempos alimentando ressentimentos. Tommy convida o pai para ser seu treinador para se preparar para uma competição de MMA, o pai é  um ex-alcoolatra, ainda em frangalhos, que pretende colocar a vida nos eixos. A relação do pai com Tommy não é boa e é através dele que sabemos que Tommy é irmão de Brendan e, ao que tudo indica, o destino (ou roteiro) reserva um encontro para os dois. Se o relacionamento de Tommy com o pai não é dos melhores, a coisa não é muito diferente quando se trata dos encontros de Brendan com o pai. Apesar do roteiro não ser muito original ao abordar a dura vida pessoal de lutadores - e todas as analogias que podemos fazer com relação da vida nos ringues com suas vidas pessoais - a direção de O'Connor tem muitos méritos. A primeira delas é utilizar um tom cru para causar equilíbrio num longa que poderia cair no mais barato melodrama ou clima motivacional. Mesmo com uma família cheia de feridas e ressentimentos no centro da narrativa, O'Connor consegue segurar a narrativa com punhos de ferro, explorando a relação entre os três personagens antes que a pancadaria do torneio comece. Já comentei antes aqui no blog que acho os filmes dos lutadores muito semelhantes entre si, mas não lembro de ter vistos cenas de luta tão bem dirigidas e com tanto impacto visual - fiquei até chocado com a desenvoltura de Tom Hardy encarnar uma verdadeira máquina de socar o oponente e a de Edgerton suportar pancadas. Apesar do roteiro investir em alguns segredos da trajetória de Tommy nas forças armadas, o interesse pelo filme é alimentado mesmo pela intensidade de seus atores e das cenas no ringue. Edgerton consegue construir um mocinho fácil de simpatizar sem esforçço, Hardy consegue captar as ambiguidades do personagem (mesmo que não lhe atribua carisma), mas acaba sendo o pai de Nick Nolte que rouba a cena. Nolte alcança momento impressionantes como o pai que tenta reconquistar a amizade dos filhos após uma vida inteira metendo os pés pelas mãos - e a cena em que   solta seus demônios num quarto de hotel já merecia sua indicação. Guerreiro é um filme que merece ser visto pela forma corajosa com que tenta equilibrar drama e pancadaria.

Guerreiro (Warrior/EUA-2011) de Gavin O'Connor com Joel Edgerton, Tom Hardy, Nick Nolte, Jennifer Morrison e Frank Grillo. 

DVD: 50%

Rogen e Joseph: momento Camila. 

Joseph Gordon Levitt foi indicado ao Globo de Ouro de Melhor Ator de Comédia/Musical por viver um jovem vítima de um câncer raro. Foi isso mesmo que você leu, 50% é um comédia sobre câncer. No cinema a abordagem cômica para o tema pode ser até uma novidade, mas para quem acompanha a série The Big C com Laura Linney na HBO sabe que a coisa é possível quando tratada com devida sensibilidade. Este é o mesmo desafio deste longa escrito pelo comediante Seth Rogen baseado na experiência de ter um amigo com câncer - e o que poderia ser uma trama de gosto duvidoso alcança alguns bons momentos que lhe garantiram uma vaga na categoria de Melhor Filme Comédia/Musical no Globo de Ouro, mas não teve força para chegar aos finalistas do Oscar. Gordon Levitt está muito bem como Adam, um jovem que possui um emprego estável e está num relacionamento cada vez mais sério com Rachel (uma melosa Bryce Dallas Howard) quando é diagnosticado com câncer. O filme poderia ser mais um daqueles dramas pesadões ou uma comédia baseada numa pessoa que aproveita a situação para fazer tudo que passar pela cabeça, mas não é bem assim, Adam tenta apenas lidar com a doença que possui 50% de chances de cura no estágio em que se encontra . Entre o mal estar da quimioterapia e a inevitável conversa com a mãe (Anjelica Huston em mais um tipo matriarca  poderosa de sua carreira). O roteiro parece mais querer brincar com os clichês do gênero do que fazer algo muito profundo sobre o assunto, deixando o clima numa segura superfície que inclui ainda a traição de Rachel e a atração de Adam por uma jovem psicóloga (a eficiente Anna Kendrick). Óbvio que existem aquelas cenas tristes sobre o tratamento, mas elas não aparecem muito. Talvez pelas indicações recebidas pelo filme e as críticas positivas eu esperasse mais do filme, que parece jogar toda a responsabilidade nos ombros esguios de seu ator principal. Joseph já havia demonstrado talento em (500) Dias com Ela (2009) e num papel que falava menos do que agia em A Origem (2010) e aqui prova que consegue carregar uma trama espinhosa nas costas sem muita dificuldade. Mas o maior problema do filme é o personagem de Seth Rogen, na pele de seu alter-ego Kyle - que aproveita a situação do amigo para conquistar garotas - o ator interpreta mais uma vez o mesmo personagem. Isso é mais do que compreensível, já que o ator criou esse tipo para sua carreira e o personagem é inspirado nele mesmo. O fato é que Kyle é totalmente desnecessário na maior parte de suas cenas (ele funciona na primeira e segunda cena de conquistador, depois começa a cansar e depois sua cena importante é aquela em que Adam briga com ele - e só), sempre baixando a tensão (como a cena em que conta ao amigo da traição de Rachel) ou o nível do humor presente no longa (como a cena em que conta para que utilizava a máquina de raspar cabelo). Fica evidente que Rogen trabalha com o improviso, mas esquece de aprofundar o seu personagem, seguindo um caminho reto e que não combina com as intenções que Joseph procura imprimir ao longa. 

50% (50/50-EUA) de Will Reiser com  Jospeph Gordon-Levitt, Seth Rogen, Bryce Dallas Howard, Anna Kendrick, Phillip Baker Hall e Anjelica Huston

CATÁLOGO: Fome de Viver

Deneuve e Bowie: vampiros cheios de estilo.

Ah! Que saudade da época que Tony Scott se arriscava a fazer filmes diferentes e interessantes! Faz um tempo que a carreira do irmão de Ridley Scott alcançou aquele piloto automático (carregado de edição frenética e Denzel Washington) que pode até arrecadar alguns milhões de dólares na bilheteria, mas perdeu a capacidade de surpreender. O primeiro longa com assinatura de Tony Scott foi este Fome de Viver - e que tem quase 30 anos e ainda consegue proporcionar aquele estranhamento quando assistimos. O filme conta a história de um casal de vampiros que após atravessar séculos de vida matrimonial caçam suas presas nos pubs dos anos 1980 (e a escolha de inserir uma espécie de clipe do Bauhaus no início com a clássica "Bella Lugosi's Dead" ajuda perfeitamente a entrar no clima da sessão). Scott demonstrou uma sabedoria ímpar ao escalar como protagonistas a beleza e o talento de Catherine Deneuve e a androginia sempre instigante de David Bowie (em mais uma de suas boas atuações que me fazem perguntar porque ele tem dedicado menos tempo ao cinema). O filme é repleto de climas e reflexões sobre a morte e mais ainda sobre o envelhecimento. Envelhecimento este que começa a assustar John (Bowie), que da noite para o dia começa a envelhecer repentinamente, algo raro para os vampiros. O motivo dessa reação incomum pode ser conhecido por Miriam Blaylock (Deneuve, lindíssima), sua parceira e que já conheceu outros vampiros que tiveram o mesmo destino (ou seja, envelhecer aceleradamente até se tornar um farrapo humano para toda a eternidade). Querendo reverter essa situação, John procura uma médica especialista em estudos sobre a relação entre o sono e o envelhecimento, Sarah Roberts (Susan Sarandon). A primeira parte do filme se concentra na angústia de John (e a cena em que envelhece uns cinquenta anos na sala de espera de Sarah é antológica), já a segunda é dedicada à busca de Miriam por uma nova pessoa para dividir a eternidade. É neste momento que Fome de Viver  parece que irá enveredar para uma trama policial (e o clima cool meio noir impresso pelo diretor colabora muito para isso), mas segue um caminho mais interessante ao extrapolar a química entre Miriam e Sarah, numa atração inexplicável que reflete muito o apelo que pelos clássicos personagens imortais de dentes pontudos despertam em nós. Quando Sarah segue um caminho semelhante ao do clássico Bebê de Rosemary (1968) com um tom cada vez mais sombrio. Fiel ao livro de Whitley Striber, o filme tem o mérito de trazer os vampiros para uma época atual sem ridicularizá-los, ressaltando a fúnebre sensualidade de suas trajetórias. Scott não perde tempo explicando como os protagonistas se conheceram (prefere utilizar alguns flashbacks que os insere na Europa do século XVIII ou Miriam no Egito) ou no final enigmático. Embora todo o estilo e atmosfera do filme não tenha o transformado em um estouro de bilheteria,  Fome de Viver se tornou um dos maiores cults da década de 1980 conquistando fãs até hoje. Pena que depois dessa experiência Tony Scott tenha enveredado por um caminho mais comercial em filmes de ação (Top Gun/1986, Um Tira da Pesada 2 /1987...) e só fez outro filme relevante dez anos depois (Amor à queima Roupa/1993, com roteiro de Quentin Tarantino). Ao final da década de 1990, Scott retomou a ideia do seu primeiro longa no seriado The Hunger que durou três temporadas (1997-1999) e contou com a participação de David Bowie no elenco (só que num papel completamente diferentes).

Fome de Viver (The Hunger/Reino Unido-1983) de Tony Scott com David Bowie, Catherine Deneuve, Susan Sarandon e Dan Hedaya. ☻☻