domingo, 15 de maio de 2011

CATÁLOGO: O Vigarista do Ano


Gere e Delpy: roteiro interessante se perde no adultério.

O sueco Lasse Hallström é reponsável por alguns dos filmes mais bonitos que eu já assisti (Minha Vida de Cachorro/1985, Gilbert Grape/1993, Regras da Vida/1999), mas nos últimos anos tem se dedicado a filmes menores que o seu talento (Sempre ao seu lado/2009, Querido John/2010). Seu último lampejo dos velhos tempos está neste O Vigarista do Ano, que poderia ter  figurado nas grandes premiações se a coisa não fosse se tornando cada vez mais aguada pelo meio do caminho. A premissa é muito promissora ao contar a história real de um escritor, Clifford Irving (a melhor atuação de Richard Gere) que  em meados da década de 1970 tenta se consolidar no mercado editorial com um livro que todos querem vender: a biografia do milionário excêntrico Howard Hughes (aquele mesmo que Leo DiCaprio fez em O Aviador de Scorsese). O grande problema é que  o livro não existe. Clifford se aproveita do fato de Hughes viver isolado do mundo com seu transtorno obsessivo compulsivo e não se comunicar com ninguém para forjar sua obra. No início o filme é muito bem resolvido, mostrando o momento em que Clifford vê brotar em sua mente a ideia do livro além da pesquisa que faz para realizá-lo da forma mais autêntica possível - para driblar os desconfiados, simula entrevistas com o milionário e aumenta sua mentira gradativamente com a ajuda do amigo Duck Suskind (o sempre confiável Alfred Molina, com quem o diretor já trabalhara em Chocolate/2000). O roteiro espertamente apresenta as diferenças entre os dois a partir de seus projetos, enquanto o de Clifford é uma farsa, Suskind pretende escrever a biografia de Ricardo Coração de Leão para crianças. Comprometido com a realidade dos fatos, Suskind sabe até o que fazer com a violência da história, mas tem problemas na parte da sodomia da História... Enquanto Clifford e Suskind se metem em enrascadas para conseguir material para o livro, a narrativa segue num ritmo crescente de tensão e ironia com a suspeita cada vez maior de que Cliff é um vigarista. O problema é que quando o filme chega em sua metade tudo vai perdendo o ritmo e a energia - justamente na parte que o filme poderia destrinchar sua alma: o fato de acreditar-se tanto numa mentira que ela acaba se tornando uma verdade. Quanto mais mergulha na vida do milionário excêntrico, o próprio Clifford parece estar ficando louco ao contruir para si uma afinidade com Hughes que na verdade é uma ilusão. Cliff ainda Julga ser  perseguido por agentes de Hughes que pedem para que coloque em sua obra revelações sobre o financiamento da campanha de Nixon, mas será que isso é verdade? E a repercussão que isso traria? Neste ponto, ao invés de mergulhar nas paranóias de seu protagonista, o filme começa a explorar cada vez mais a vida adúltera de Clifford. Hallström começa a perder cada vez mais tempo com a relação do personagem com sua esposa (uma Marcia Gay Haden loura) e a amante (a francesa Julie Delpy, num papel que perde cada vez mais a graça) e esquece do que mais interessa ao seu roteiro. Quando volta seu foco para o que importa já estamos desanimados e não importa o esforço de Gere (que poderia até ter sido lembrado nas premiações por sua performance) e seus editores vividos por Hope Davis e Stanley Tucci, o filme já desandou. Quando o escândalo se instaura a tensão já desapareceu e só nos resta ver a previsível punição de Clifford - não só com a justiça, mas também com as pessoas que se relacionavam com ele. No fim das contas Hallström entrega um filme pior do que o prometido, mas que ainda possui lampejos do poder de sua força narrativa. Jamais pensei em dizer isso, mas o filme vale mesmo pela atuação de Gere com o cabelo mais infeliz de sua carreira.     

O Vigarista do Ano (The Hoax/EUA-2006) de Lasse Hallstöm com Richard Gere, Alfred Molina, Hope Davis, Stanley Tucci, Marcia Gay Haden e Julie Delpy. ☻☻

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